PUBLICIDADE

Urgência da mudança climática eleva pressões políticas e econômicas pelo mundo

Fechamento de uma refinaria da petrolífera Galp causou comoção em Portugal em abril deste ano

Foto do author João Gabriel de Lima
Por João Gabriel de Lima
Atualização:

LISBOA - Um dos maiores dramas do mundo atual será a conversão para a economia verde. Trata-se de um enredo científico com componentes econômicos e políticos – presentes num episódio que causou comoção em Portugal em abril deste ano, o fechamento de uma refinaria da petrolífera Galp.

Ativistas protestamnas ruas de Glasgow durante a COP-26 Foto: Robert Perry/EPA/EFE

PUBLICIDADE

No lado econômico está a visão estratégica da empresa que, na ocasião, emitiu um comunicado: “Antevê-se que a próxima década seja de profunda transformação. As imposições regulatórias, os desenvolvimentos tecnológicos e os custos cada vez mais reduzidos das opções de baixo carbono vão levar a sociedade a acelerar cada vez mais em direção a um futuro mais limpo”. Na semana passada, a Galp fez jus a um aporte de 732 milhões de euros do Banco Europeu de Investimentos – a União Europeia está empenhada em incentivar a produção de energia limpa com o objetivo de atingir a neutralidade carbônica até 2050.

O lado político se fez sentir na Assembleia da República portuguesa. Parlamentares à direita e à esquerda se incomodaram com a extinção de aproximadamente 500 empregos diretos e mil indiretos.

Até o primeiro-ministro António Costa, com histórico de políticas sustentáveis, criticou a Galp – que usou parte dos fundos da União Europeia para requalificar parte dos funcionários. Com um olho no presente, a empresa pretende continuar a refinar petróleo em outra planta. O outro olho está no futuro – a Galp criou um grupo de trabalho para decidir que destino dar ao local. O grupo, liderado por Rodrigo Tavares, professor de finanças sustentáveis da Nova School of Business and Economics, está estudando dezenas de projetos de transformação industrial e de revitalização urbana sustentável pelo mundo.

Urgência

As duas visões – a econômica e a política – estão corretas. Sim, o mundo terá de se mover na direção da economia de baixo carbono. Há urgência e oportunidade. Há crédito no presente e lucros no horizonte. E, sim, tal conversão será dolorosa. Se o planeta girar no sentido correto – o da preservação da esfera azul que habitamos – empregos serão destruídos e atividades econômicas desaparecerão do mapa. Políticos hesitarão diante da mudança que precisa ser feita, com medo de perder votos.

Foi-se o tempo em que o principal obstáculo da mudança climática eram os “céticos do aquecimento global” – desmoralizados, eles hoje são conhecidos como “negacionistas”, nome mais apropriado aos que desconsideram evidências científicas. Há consenso em torno do que precisa ser feito. A grande questão é como fazer – com o máximo de eficiência e o mínimo de dano.

Publicidade

Funcionários trabalham em refinaria da Galp em Portugal Foto: Jose Manuel Ribeiro/Reuters - 2013

Vários economistas têm-se debruçado sobre o problema. Um deles, William Nordhaus, ganhou um prêmio Nobel por um conjunto de estudos sobre a questão. Nordhaus acaba de lançar um livro, The Green Spirit, onde resume suas ideias de maneira clara e brilhante. Ao longo dos séculos a economia se desenvolveu consumindo o planeta. Houve combinação entre crescimento e destruição na era globalizada que se iniciou no século passado. A pobreza absoluta, a fome endêmica e a desigualdade diminuíram, mas a um alto preço. Nordhaus defende que, agora que sabemos o custo, devemos pagar por ele. Se fizermos isso, poderemos continuar crescendo – mas em bases mais sustentáveis.

Para além da governança de cada país, existe o emaranhado de acordos internacionais. Na COP-15, em Copenhague (2009), havia a esperança de que algum tipo de liderança global poderia colocar o planeta no rumo certo. Na COP-21 (2015), a do Acordo de Paris, tal ilusão se desfez.

O microcosmo da Galp mostrou como a transição para a economia verde será dramática para todos os países, ao gerar vencedores e perdedores. Se as boas ideias da sociedade civil triunfarem, no médio prazo, sobre o desmatamento que enfraquece nossa posição, o Brasil tem enorme potencial para transformar o drama em oportunidade.

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.