Tribunal anula autorizações para exploração mineral em terras indígenas no Pará

Ação foi movida pelo Ministério Público Federal; na decisão, Justiça fala em necessidade de licenciamento e consulta às comunidades locais

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Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA – O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) anulou todas as autorizações para exploração mineral em terras indígenas na região de Tucuruí, no Pará. A decisão acatou o pedido de uma ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF).

O caso foi julgado pela 5ª Turma do tribunal, em 15 de dezembro e a decisão unânime foi divulgada nesta quarta-feira, 26. Conforme informou o MPF, o Tribunal negou apelações da Agência Nacional de Mineração (ANM) e da mineradora Vale.

Fachada do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1);Tribunal anulou autorizações para exploração mineral em terras indígenas no Pará Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

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A ANM fica proibida de liberar novas autorizações de pesquisa mineral, permissão de lavra garimpeira e concessão de lavra mineral na região, no perímetro que abrange as terras indígenas Parakanã, Trocará e suas adjacências.

O relator, desembargador federal Souza Prudente, lembrou que é “ilegal a existência de atividades de exploração minerária em terras indígenas – ainda que com interferência periférica – bem como a constatação de processos administrativos para a autorização de pesquisa e de exploração mineral nas referidas terras, tendo em vista que inexiste lei complementar conforme a exigência constitucional, nem autorização do Congresso Nacional, participação das comunidades indígenas afetadas no resultado da lavra ou relevante interesse público da União Federal.”

A decisão acatou o argumento do MPF. “Mesmo que as áreas objeto de autorizações de exploração mineral ou de requerimentos a esse respeito não estejam localizadas integralmente em Terras Indígenas, a mera proximidade do empreendimento econômico é suficiente para impactar social e ambientalmente as comunidades indígenas”, declarou Souza Prudente.

O TRF1 afirmou que, mesmo que a exploração fosse legal, haveria necessidade de licenciamento ambiental e consulta prévia, livre e informada das comunidades indígenas e tradicionais ocupantes das áreas adjacentes, conforme protocolos de consulta prévia, elaborados pelas comunidades, nos termos da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

“Não há que se falar em cancelamento de autorizações de pesquisa e exploração mineral apenas em terras indígenas definitivamente homologadas, uma vez que o processo demarcatório possui natureza jurídica declaratória, sendo que merecem igual proteção as terras indígenas com demarcação ainda não concluída”, afirmou Souza Prudente.

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A Agência Nacional de Mineração declarou que “reitera a observância do previsto no ordenamento jurídico brasileiro no desenvolvimento de suas ações institucionais”. Disse ainda que, quando há decisões judiciais, o órgão “entende que nos cabe cumpri-las, estritamente”.

Procurada pela reportagem, a Vale informou que a decisão “não se aplica a qualquer direito ou processo minerário da Vale, já que a empresa anunciou no ano passado a desistência de todos os seus processos minerários (incluindo pedidos de pesquisa e lavra) interferentes em terras indígenas”. 

“A empresa não tem direitos minerários nas terras indígenas mencionadas, não desenvolve quaisquer atividades de pesquisa mineral ou lavras em terras indígenas e que a desistência se baseia no entendimento de que a mineração nessas áreas só pode se realizar mediante Consentimento Livre, Prévio e Informado dos próprios indígenas e numa legislação que permita e regule adequadamente a atividade”, declarou a empresa. 

A Vale informou que o recurso judicial que moveu foi interposto pela companhia anteriormente à decisão corporativa sobre o assunto e dizia respeito, exclusivamente, ao pedido de ingresso na ação judicial.

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Segundo informações divulgadas pelo MPF, a Agência Nacional de Mineração também terá prazo de 180 dias para concluir os procedimentos administrativos de requerimentos minerários incidentes sobre terras indígenas na região de Altamira, no Pará. A ordem foi dada em outra sentença que atende parcialmente pedidos do MPF.

A ação pediu que fossem cancelados todos os pedidos para exploração minerária que estão sobrepostos a terras indígenas na região, mas a Justiça Federal entendeu que cabe à ANM fazer o indeferimento em procedimentos administrativos, dando aos particulares que fizeram os requerimentos a chance de defenderem a legalidade de seus pedidos individualmente.

No caso das terras indígenas ainda não homologadas (que já tiveram concluída a demarcação), a ANM tem prazo de 60 dias para indeferir os pedidos.

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Para a Justiça Federal, as etapas anteriores à homologação de uma terra indígena – identificação, delimitação e declaração – não são tarefas triviais e dependem “de estudos realizado por grupo técnico especializado coordenado por antropólogo, levantamento fundiário, relatório circunstanciado e aprovação pelo presidente da Funai”. “A existência desse rigoroso procedimento é suficiente para justificar a presunção relativa de que as áreas que passaram por tais filtros se enquadram na hipótese prevista pelo artigo 231 da Constituição Federal”, conclui a sentença.

A própria ANM informou à Justiça Federal que existem 1.752 requerimentos pendentes de apreciação na agência. “Embora seja plausível a alegação de que, em 2020 e 2021, a pandemia causada pela covid-19 tenha atrapalhado a realização das diligências, não há qualquer comprovação da existência de algum tipo de planejamento para retomada das atividades”, informa a sentença, que considera haver “omissão da administração pública em adotar as providências necessárias para apreciação dos procedimentos pendentes”.

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