Servidores do Ibama culpam 'colapso da gestão ambiental' por recordes de desmatamento

Manifestação técnica assinada por mais de 500 profissionais da fiscalização critica duramente a gestão do governo

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Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA – Em uma manifestação técnica assinada por mais de 500 servidores de carreira do Ibama, os profissionais da fiscalização ambiental federal do País criticaram duramente a gestão do governo quanto a medidas para combater os crimes ambientais e alertaram que o Brasil está prestes a registrar um novo recorde de devastação, como reflexo dessa gestão.

A manifestação foi encaminhada nesta terça-feira, 21, ao presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, ao vice-presidente da República e presidente do Conselho da Amazônia, general Hamilton Mourão, ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia e ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, além da procuradora da República e coordenadora do Grupo de Trabalho Amazônia Ana Carolina Haliuc Bragança.

Desmatamento na Amazônia Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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No documento, os servidores afirmam que a desestruturação do Sistema Nacional de Meio Ambiente e a adoção de medidas que reduzem a autonomia e a capacidade de atuação institucional do Ibama “agravaram o cenário de altas taxas de desmatamento, degradação e incêndios florestais no ano de 2019” e que “a ausência de medidas efetivas para a retomada da relevância estratégica do Ibama continuam apontando para o colapso da gestão ambiental federal e estimulando o cometimento de crimes ambientais”.

Os funcionários pedem que os cargos em comissão do Ibama sejam assumidos por servidores públicos da carreira de especialistas em meio ambiente, com perfil profissional e formação acadêmica compatível, inicialmente via decreto, implementando-se na sequência as tratativas para conversão em lei. Cobram autonomia institucional do órgão, “preservando-o contra ingerências e constrangimentos no desempenho das atribuições legais e regulamentares, principalmente no exercício do poder de polícia ambiental”.

A devolução dessa autonomia, afirma o documento, passa por sua assessoria de imprensa, que foi completamente afastada de suas funções, por ordem do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. A manifestação técnica lembra ainda que “no escopo da divulgação de resultados pela Operação Verde Brasil II (GLO), a imagem do Ibama e dos demais órgãos ambientais como instituições protagonistas na proteção do bioma amazônico vem sendo deliberadamente substituída pela das Forças Armadas, mesmo não sendo esta uma das suas funções principais”.

Os profissionais também lembraram das pretensões de se fazer mudanças na regulamentação ambiental em meio à pandemia do coronavírus, como propôs Salles durante a reunião ministerial no Palácio do Planalto, para aproveitar o momento em que a imprensa está concentrada na cobertura do tema e “passar a boiada” na área ambiental.

Sem citar o nome de Salles, os servidores afirmam que“a proteção ao meio ambiente somente é possível a partir de uma regulamentação ambiental adequada” e que consideram “inaceitável que o cenário de pandemia seja utilizado como pano de fundo para o enfraquecimento da legislação ambiental, fazendo-se necessário, ao contrário, revisão da legislação criminal, com agravamento de penas para os crimes ambientais.”

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Na manifestação, os servidores lembram uma carta de mesmo teor que publicaram no ano passado e afirma que o “documento, assinado por quase 700 servidores de carreira, alcançou ampla repercussão nacional e internacional, mas foi lamentavelmente ignorado pelos decisores e pelos agentes políticos e econômicos do país. Infelizmente as previsões ali expostas se concretizaram”.

Os dados técnicos evidenciam a contínua ascensão do desmatamento na Amazônia Legal, alertam. Considerando a série histórica das detecções de supressão de vegetação pelo sistema Deter, do Inpe, nos últimos cinco anos, houve uma intensificação de 49,7% no período de agosto/2018 - julho/2019 em relação ao mesmo período do ano anterior. No período de agosto/2019 à 09 de julho/2020, o aumento já foi de 13,7% em relação ao ano anterior, faltando ainda 21 dias para finalização do período de medição.

“Se no mês de julho deste ano constatar-se a metade do desmatamento que tivemos em julho de 2019, fecharemos o Deter dos 12 meses do período PRODES com 8. 672 km². Se a proporção entre o que é detectado com o Deter se mantiver na média de 66% do Prodes, podemos estimar um Prodes 2020 chegando na casa dos 13 mil km² de desmatamento na Amazônia, um aumento estimado de 28% em relação a 2019 e 72% em relação a 2018”, afirmam.

Procurados, o Ibama e a vice-presidência da República não se manifestaram sobre o assunto até a publicação deste texto.

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