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Projeto que flexibiliza licenciamento abre espaço para ‘guerra fiscal ambiental’

Na visão de técnicos que acompanham o assunto, a isenção de cobranças de taxas de licenciamento ou aglutinação de fases pode provocar uma disputa regional por esses projetos

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Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA – O projeto da nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que começa a ser debatido em audiência pública a partir desta segunda-feira, 17, acaba com as limitações para que Estados e municípios tinham para fazer seus próprios processos e regras de licenciamento.

Pesquisas comprovam que as rodovias são o principal vetor da destruição da floresta Foto: VINICIUS MENDONCA - IBAMA

As mudanças, que tiram poder do Ibama e abrem espaço para o licenciamento local, teriam o objetivo de atrair empreendimentos, mas podem acabar incentivando a chamada “guerra fiscal ambiental”. Na visão de técnicos que acompanham o assunto, a isenção de cobranças de taxas de licenciamento ou aglutinação de fases pode provocar uma disputa regional por esses projetos. O relator do PL do Licenciamento, deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), diz que sua proposta é equilibrada e contempla o interesse de todos. Conforme reportagem publicada em abril pelo ‘Estado’, o PL altera profundamente o processo de emissão dessas autorizações no País, extinguindo a necessidade de licenças para boa parte das atividades agropecuárias e empreendimentos de infraestrutura. No caso da dispensa de licença para obras de infraestrutura, há uma preocupação com o asfaltamento e ampliação de estradas, sobretudo na Amazônia. Pesquisas comprovam que as rodovias são o principal vetor da destruição da floresta. O projeto retira completamente a necessidade de licenciamento para obras de melhoria, modernização, manutenção e ampliação de capacidade em estruturas pré-existentes. Faixas de domínio e de servidão de rodovias, ferrovias e linhas de transmissão de energia, por exemplo, também ficam isentas de processo de licenciamento, além de dragagens (retirada de sedimentos) de manutenção em rios e mares. O consultor jurídico do Instituto Socioambiental, Maurício Guetta, diz que o projeto “é uma colcha de retalhos” que isenta atividades impactantes de licenciamento, reduzindo  segurança ambiental das obras. Apoiado pelos ministérios do Meio Ambiente, Agricultura e Infraestrutura, o projeto estabelece ainda a autorização automática para licenças, por decurso de prazo, no caso de atraso em manifestação de órgãos como o Instituto do Patrimônio Artístico Nacional (Iphan) e a Fundação Nacional do Índio (Funai). Kataguiri foi designado coordenador do Grupo de Trabalho (GT) criado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para discutir o projeto. Esse colegiado tem prazo de 60 dias, prorrogável por mais 60 dias, para apresentar um relatório. No início do mês, o presidente da Câmara havia aprovado a criação da Comissão Especial para estudar e apresentar propostas para a "construção de um equilíbrio entre setores produtivos e ambientalistas" sobre o projeto de lei do licenciamento, mas decidiu cancelar o próprio ato dois dias depois. A comissão foi extinta e, em seu lugar, foi criado o "grupo de trabalho" na Câmara, que se encarregará do tema. O calendário desse grupo prevê dez audiências públicas para debater a proposta. Os eventos, que começam nesta segunda-feira, acontecerão até 9 de julho. Rodrigo Maia disse que a adoção do GT¨não vai eliminar o debate em torno do assunto, mas adequá-lo ao mesmo processo já adotado, por exemplo, nas discussões sobre o pacote anticrime do ministro da Justiça, Sergio Moro, que passou a ser analisado por um grupo de trabalho de parlamentares. Ambientalistas reclamam do pouco tempo da tramitação e temem que suas propostas não sejam discutidas adequadamente, já que a figura do GT não permite debates parlamentares antes do projeto chegar ao plenário. Maia assumiu o assunto como parte de sua agenda de desburocratização e estímulo à economia. Sua principal bandeira é a redução e fixação de prazos para a concessão das licenças. Cientistas, ambientalistas e Ministério Público argumentam que o enfraquecimento das regras do licenciamento pode ampliar o desmatamento e o risco de desastres socioambientais, como os de Mariana e Brumadinho (MG), entre outros.

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