Professor da Unesp cria placa móvel de energia solar

Movido por um motor de passo, o sistema gera 53% mais energia do que o convencional

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Por Karina Ninni
Atualização:

O potencial brasileiro de energia solar é imenso, pois nosso País é privilegiado em matéria de radiação solar. De acordo com o Plano Nacional de Energia 2030, que reproduz dados do Atlas Solarimétrico do Brasil, o Nordeste brasileiro possui radiação comparável às melhores regiões do mundo nessa variável, como a cidade de Dongola, no deserto do Sudão, e a região de Dagget, no Deserto de Mojave, Califórnia.

 

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Entretanto, a participação do sol na matriz energética nacional é mínima. No Banco de Informações de Geração (BIG), da Aneel, consta apenas uma usina fotovoltaica: Araras, no município de Nova Mamoré (RO), com potência instalada de 20,48 kW. Fora isso, existem sistemas isolados em comunidades e pequenas cidades, geralmente inseridos em projetos que têm algum tipo de financiamento do governo ou de ONGs.

 

De acordo com a maioria dos especialistas, o grande problema é o custo dos sistemas fotovoltaicos, que ainda não cabe no bolso da maioria dos brasileiros. Some-se a isso o fato de que os sistemas convencionais, com placas fixas de captação de energia solar, têm eficiência que não chega a 20% (o Sol, em condições ideais, manda para a Terra o equivalente a 1000 Watts de radiação por metro quadrado. E só se consegue gerar 200 W de energia por m²).

 

Com o objetivo de gerar mais energia no mesmo espaço, com os materiais já existentes no mercado, o professor Alceu Ferreira Alves, da Faculdade de Engenharia de Bauru (Unesp), criou um sistema para mover as placas ao longo do dia, acompanhando o “movimento do Sol” (na verdade, o movimento da Terra em redor do Sol).

 

O Estado falou com ele sobre a novidade, que gera 53% mais energia do que o sistema convencional. Acompanhe a entrevista.

 

O Estado – Já existem outros projetos de placas móveis no mundo. Qual é o diferencial do seu projeto?

 

Alceu Ferreira Alves – Isso já existe sim, inclusive comercialmente. Mas é um sistema chamado de “solar tracking”: trabalha com sensores que rastreiam o Sol. Meu protótipo não tem sensores. Nós desenvolvemos um software que calcula a “posição aparente” do Sol. Usamos, para isso, equações astronômicas já conhecidas que relacionam variáveis como dia do ano, hora, latitude e longitude. A partir dos dados gerados por essas equações, consigo saber a posição do Sol. O sistema tem um motor, igual aos motores de impressora para papel, que movimenta a placa com base nesses dados. É mecânico.

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O Estado – Como é alimentado o motor?

 

AFA – Pode ser alimentado pelo próprio sistema fotovoltaico. A placa carrega as baterias que alimentam o motor. No pior caso, um dia de pouco sol, o motor consumiria para movimentar a placa 0,0095% da energia gerada.

 

O Estado – Esse sistema tem vantagens com relação ao sistema convencional, que utiliza placa fixa? Se sim, quais?

 

AFA – Olha, tem vantagens e desvantagens. Entre as vantagens estão a facilidade de implementação e o controle do sistema, que é simples. Entre as desvantagens está a necessidade constante de manutenção, que no sistema de placa fixa não existe. Para saber realmente o quanto ele é mais vantajoso que o fixo em termos monetários, eu precisaria calcular os custos de manutenção. Isso eu ainda não fiz. Mas é claro que, por conta da movimentação da placa, a vantagem mais aparente é o ganho na produção de energia, que é da ordem de 53%.

 

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O Estado – E com relação ao sistema que utiliza o “solar tracking”, há alguma vantagem?

 

AFA – Bem, não sei se é uma vantagem, vamos chamar de característica. Meu sistema não necessita de retroalimentação constante, que é o que os sensores fazem: eles têm de dizer para o motor, a todo momento, onde o Sol está. O sistema que criei trabalha com precisão pré-definida. O computador envia o número de pulsos e o motor movimenta a placa. Trabalhamos com um intervalo de 4 minutos, ou seja: a cada 4 minutos, a placa se movimenta 1 grau. Em uma hora, movimenta-se 15 graus, que é o equivalente a uma unidade de fuso-horário da Terra.

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O Estado – O próximo passo é tentar comercializar o sistema?

 

AFA – Inicialmente a idéia não era essa. Mas, depois que cheguei à conclusão de que era mais vantajoso que o sistema de placa fixa, eu acredito que tenhamos boas chances no mercado. Se fosse comercializado, seria em forma de um kit. E, pelo que presumo, nosso produto poderia chegar ao mercado mais barato do que o sistema que utiliza sensores. 

 

O Estado – Já existe alguém interessado?

 

AFA – Como agora é que eu divulguei os dados, ainda não recebi ofertas. Mas ontem chegou um e-mail de um empresário interessado em conhecer o sistema. O que eu quero agora realmente é tornar o sistema cada vez mais inteligente. Fazer com que a própria placa fotovoltaica funcione como um “sensor”, que nos diria, por exemplo, quando o céu está nublado. Porque, dependendo das condições do clima, a placa nem precisaria se mexer. Quando há nuvens e pouca radiação solar, não é vantagem gastar energia com o movimento da placa.

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