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País não cumpre meta nacional de proteção à biodiversidade marinha

Por Herton Escobar
Atualização:

Faltando apenas duas semanas para o início da mais importante conferência sobre a biodiversidade do planeta, o Brasil ainda enfrenta enormes dificuldades para conhecer e proteger seus vastos ecossistemas oceânicos.

 

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Estima-se que menos de 10% das espécies marinhas brasileiras sejam conhecidas. E apenas 1,5% dos ecossistemas costeiros e marítimos do País está protegido por lei – muito abaixo da meta de 10% estipulada para este ano. “De fato, houve pouco avanço”, reconhece o secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Braulio Dias. “A zona marinha é a que tem a menor proporção de áreas protegidas no Brasil.”

 

A meta de 10% foi estipulada em dezembro de 2006 pela Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio), como parte do esforço brasileiro para o cumprimento dos objetivos da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) das Nações Unidas, que realizará sua décima Conferência das Partes (COP 10) no fim deste mês, em Nagoya, no Japão.

 

A meta para a Amazônia (30%) foi cumprida. Mais de 40% da floresta está sob alguma forma de proteção, dentro de terras indígenas ou unidades de conservação estaduais e federais. Mas a da “Amazônia Azul”, como se costuma chamar os 4,2 milhões de quilômetros quadrados do território brasileiro que estão cobertos de água, afundou no esquecimento.

 

A maior parte do 1,5% protegido está, na verdade, em ambientes terrestres associados à zona costeira, como restingas, praias e manguezais. E, ainda assim, a lacuna de proteção é grande.

 

Segundo o Panorama da Conservação dos Ecossistemas Costeiros e Marinhos no Brasil, um estudo inédito que deverá ser lançado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) até o fim do ano, somente 18% dos estuários (áreas onde os rios encontram o mar), por exemplo, estão em áreas protegidas. Esse índice cai para quase zero (0,2%) quando se considera apenas as unidades de proteção integral, onde não são permitidas atividades de exploração econômica.

 

No caso dos manguezais, um ecossistema crítico para a reprodução de várias espécies marinhas, o porcentual total de proteção chega a animadores 75%, incluindo áreas de proteção ambiental (APAs) ocupadas por fazendas de camarão e outras atividades comerciais. Mas cai para desanimadores 13% quando se considera apenas as unidades de preservação integral.

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No ambiente estritamente marinho, a proteção é mínima, sempre limitada às áreas próximas da costa ou ao entorno de ilhas. Não há nenhuma unidade de conservação 100% marinha. Segundo o relatório do MMA, o bioma marinho representa “a grande lacuna” do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), “demandando medidas urgentes visando ao planejamento de sua conservação”. O único consolo, talvez, é que o Brasil não está sozinho nessa história. Globalmente, também, menos de 1% dos oceanos está protegido, apesar da meta da Organização das Nações Unidas de chegar a 10% até 2012.

 

Lacuna científica

 

O problema não é só político. A falta de informações científicas sobre o que vive debaixo d’água também dificulta a elaboração de estratégias e políticas de proteção marinha. “Fazer conservação sem informação é muito complicado”, diz a bióloga Monica Peres, especialista na avaliação de espécies marinhas ameaçadas.

 

Com 10,8 mil quilômetros de costa, estendendo-se desde 4 graus de latitude norte até 34 graus de latitude sul, o Brasil tem uma das maiores e mais diversificadas combinações de ecossistemas costeiros e marítimos do planeta. Apesar disso, sua biodiversidade marinha conhecida é relativamente pobre, comparada à de outros países.

 

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Segundo o biólogo Antonio Marques, porém, a maior falta não é de espécies, mas de pesquisas e pesquisadores suficientes para estudá-las. Proporcionalmente, segundo ele, o Brasil tem cerca de 15% das espécies conhecidas de vertebrados no mundo e 13% das de insetos. No grupo dos “invertebrados não insetos” – a maioria dos quais vive no mar, como águas-vivas, polvos, lulas, caranguejos, lagostas, mariscos, esponjas e corais – essa proporção cai para 6%.

 

“Seis por cento das espécies do mundo num único país não é pouca coisa, mas não há como negar que a nossa biodiversidade marinha é amplamente desconhecida”, afirma Marques, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo. “Eu considero isso uma vergonha.” O conhecimento disponível, segundo ele, além de insuficiente, está altamente concentrado no litoral de São Paulo, Rio e Santa Catarina. “Sobre o Nordeste ainda sabemos muito pouco. E sobre o Norte, quase nada.”

 

Estudos mostram que a composição de espécies marinhas pode variar muito de uma área para outra, mesmo entre regiões próximas da costa, por causa de variações de corrente, temperatura, composição química da água e tipo de substrato. “Temos muitas espécies, certamente. O que não temos é uma concentração tão forte quanto a que ocorre em outros locais, como no Caribe”, avalia Antonio Solé-Cava, diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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