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Orquídea dada como extinta volta a florir na Mata Atlântica em São Paulo

Após 50 anos sem ser documentada, a 'Octomeria estrellensis' foi vista em reserva e reproduzida in vitro

Por Ícaro Malta
Atualização:

A flor pequena chamou a atenção do biólogo Luciano Zandoná, que trabalhava documentando flores de árvores caídas na reserva particular Legado das Águas, entre as cidades de Juquiá, Miracatu e Tapiraí, no Vale do Ribeira (SP). Não escapou de seu olhar treinado a planta da espécie Octomeria estrellensis, que não era vista na natureza em território paulista desde a década de 1960 e foi considerada extinta em 2016. “Somente depois de florir é que podemos ter a certeza da espécie de uma planta, mesmo que ela tenha uma morfologia bem característica”, explica Zandoná. 

A confirmação veio pela flora dessa orquídea, que mede apenas 2 centímetros. Quando foi redescoberta, em 2017, 38 indivíduos foram recolhidos e estudados. A partir disso, um novo trabalho, de reprodução e preservação da espécie, teve início. Foram produzidos dois frutos por meio de uma polinização manual, que foram enviados para o Orquidário Colibri. Os frutos geram cerca de 600 mudas. “Nós fizemos mais que um levantamento florístico. Além da documentação, nós criamos um plano de ação para conservação da espécie”, afirma Zandoná. 

Orquídea dada como extinta volta a florir em SP Foto: Luciano Candisani

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Não é possível só elencar um único motivo para a extinção da Octomeria estrellensis. “É uma micro-orquídea, uma planta de tamanho diminuto. Ela depende de um microclima muito equilibrado: temperatura, umidade e regime de chuva”, explica o biólogo. Para ele, o desmatamento, o aquecimento global e a diminuição de polinizadores, como abelhas, borboletas e beija-flores (além, principalmente, da coleta ilegal de plantas), são os principais fatores por trás da quase extinção da espécie. Nacionalmente, essa orquídea é classificada como “quase ameaçada”, conforme avaliação feita em 2012 pelo Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora).

DESEQUILÍBRIO

A extinção de uma espécie, mesmo que pequena, pode ter graves consequências. “A gente não conhece a nossa biodiversidade, que é nossa riqueza. A nossa vida depende desses recursos, e uma pequena planta como essa é como uma pequena engrenagem em uma grande máquina. Sem aquela engrenagem, toda a máquina fica em desequilíbrio”, explica. 

Autor da redescoberta da Octomeria estrellensis, Zandoná é responsável pela estruturação do programa de conservação de orquídeas na reserva, que registrou 232 espécies de orquídeas no Legado das Águas, entre 2015 e 2019. Fundado em 2012 e mantido pela Votorantin S.A., o Legado das Águas é considerado uma das maiores reservas privadas de Mata Atlântica do Brasil. 

Para David Canassa, diretor-geral das Reservas Votorantim, a redescoberta é uma vitória do trabalho da reserva. “Quando a gente começou, existia muita descrença. A proposta é muito diferente: gerar valor com a floresta em pé”, afirma Canassa. 

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COMERCIALIZAÇÃO

A administração da reserva estuda a possibilidade de vender orquídeas. A ideia é desestimular a coleta ilegal, que ocorre pelo alto valor ornamental das plantas.

O programa de conservação de orquídeas da reserva é supervisionado por Miguel Flores, responsável por monitorar e realocar orquídeas na reserva. Foi ele que observou o crescimento da espécie na natureza. “Ver as plantas soltando raízes, novos brotos, flores, e os frutos se formando, é uma coisa que não tem preço”, relata. Para Flores, a comercialização de orquídeas pode ser uma saída viável. “Comercializar plantas produzidas por sementes in vitro, e não plantas coletadas ilegalmente, é uma boa desde que bem fiscalizado”, afirma. No Brasil, estão registradas mais de 2,4 mil espécies de orquídeas, de aproximadamente 25 mil já conhecidas em todo o mundo.

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