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Milton Hatoum escreve poema inédito sobre destruição da Amazônia

'Não consigo olhar fotos que mostram incêndios na Amazônia', afirma escritor

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Por Ubiratan Brasil
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Em poema inédito, divulgado pelo 'Estado', Milton Hatoum revela seu inconformismo com a destruição da floresta amazônica Foto: Gabriela Biló/Estadão

SÃO PAULO - “Não consigo olhar fotos que mostram incêndios na Amazônia”, conta, voz embargada, o escritor e colunista do Estado Milton Hatoum. Nascido em Manaus, em 1952, ele lá viveu até a adolescência, quando iniciou sua trilha pelo mundo. Desde 1999, mora em São Paulo, mas suas raízes continuam fincadas na capital do Amazonas, cujas lendas e problemas inspiram sua escrita.

“Meus romances falam de uma Manaus que não existe mais. O urbanismo em harmonia com a floresta acabou nos anos 1980. A cidade que está lá hoje é uma das mais desiguais do Brasil”, disse ele, em entrevista em 2013. “Desde a década de 1970, venho apontando para os problemas da devastação daquela área”, diz Hatoum agora, lembrando que, em 1977, publicou um livro de poemas, Amazonas, ilustrado com fotos de Isabel Gouvêa, João Luiz Musa e Sônia da Silva Lorenz. Ali, seus versos lamentavam a destituição da herança cultural (crenças, rituais de trabalho, aspirações) da população, como também acontece no poema O Fim que Se Aproxima, que o Estado publica aqui em primeira mão (no vídeo abaixo, o escritor faz a leitura do poema).

O Fim que Se AproximaMilton Hatoum Amazonas: mito grego menos antigo que os mitos da Amazônia.

Os que vivem no Cosmo há milênios são perseguidos por mãos de ganância,  olhos ávidos: minério, fogo, serragem, fim. 

Quem são vocês, incendiários desde sempre,  ferozes construtores de ruínas? 

Os que queimam, impunes, a morada ancestral,  projetam no céu mapas sombrios: manchas da floresta calcinada, cicatrizes de rios que não renascem.

Qual Brasil se esconde  atrás da humanidade amazônica?

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Que triste pátria delida, mais armada que amada: traidora de riquezas e verdades.

Quando tudo for deserto, o mundo ouvirá rugidos de fantasmas. E todos vão escutar, numa agonia seca,  o eco:

Não existirão mundos, novos ou velhos, nem passado ou futuro.

No solo de cinzas:  o tempo-espaço vazio.

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