Microsoft, Fundo Vale e Imazon lançam sistema que usa inteligência artificial para prever desmate

Nova ferramenta aponta 9.635 km² da Amazônia sob risco e 192 municípios sob forte ameaça de devastação

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Por Pablo Pereira
Atualização:

SÃO PAULO - Um arco de forte pressão sobre a natureza que se estende do Acre ao Pará, passando por Rondônia, sul do Amazonas, além de áreas de Roraima. São 9.635 km² de floresta sob risco de desmatamento em 2021, abrangendo 192 municípios com “risco alto ou muito alto” de devastação. Só no último semestre, o impacto soma 4 mil km². Os dados são de estudo feito por uma parceria entre a ONG Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a Microsoft e o Fundo Vale, que lançaram esta semana a PrevisIA, plataforma que usa inteligência artificial (IA) para prever as áreas com a maior ameaça de desmate na Amazônia.

Pelo mapa da plataforma, é possível localizar o impacto da devastação existente sobre 48 terras indígenas, que apresentam áreas “sob risco alto ou muito alto” de desmatamento, assim como 18 unidades de conservação, dois territórios quilombolas e 789 assentamentos rurais que também sofrem esse nível de pressão. Carlos Souza Jr., pesquisador associado do Imazon, já avalia novos dados do sistema que devem ser atualizados a semestralmente. “Nossa meta é atualizar a cada seis meses, mas talvez já seja possível fazer trimestralmente”, disse o cientista ao Estadão.

Desmatamento na Floresta Nacional de Jamanxim, perto deNovo Progresso, no Pará Foto: Amanda Perobelli/Reuters - 11/9/2019

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Para enxergar as áreas ameaçadas, a PrevisIA analisa variáveis que mostram áreas sob maior risco de devastação. Entre as informações  fornecidas para a visualização no mapa de risco estão a existência de estradas legais e ilegais, localização de topografia, cobertura do solo e infraestrutura urbana, assim como a combinação de dados socioeconômicos da região.

Na análise, segundo os técnicos, a ferramenta conta um algoritmo de IA e com um modelo de risco desenvolvidos pelo Imazon e recursos avançados de nuvem de computadores do Microsoft. Além do mapa de calor, a ferramenta possibilita a análise dos dados e cria rankings de Estados e cidades com maior probabilidade de terem áreas de floresta destruídas.

Souza Júnior ressalta que é importante que a plataforma seja ágil para mostrar onde há ondas de risco de desmatamento. “Para o modelo, a gente usa dado anual do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia) sobre desmatamento, mas para a atualização vamos incorporar os dados de alerta de desmatamento, que são mensais”, explicou. Assim como o Inpe, o Imazon tem um sistema de alerta, o SAD.

Só em junho, a devastação florestal atingiu 926 km², “área quase três vezes maior” que a área de Fortaleza, conforme o SAD. Dados de acumulados em 11 meses mostram alta de 51% de agosto de 2020 a junho deste ano ante o mesmo período anterior (agosto de 2019 a junho de 2020). “Esperamos que haja ações públicas, das autoridades, nessas ilhas de calor para que sejam cada vez menores”, defendeu Souza Júnior. “E a ferramenta vai permitir que essas ações sejam também visualizadas e avaliadas”, completou o pesquisador.

Além do Imazon, o lançamento da ferramenta contou com  Rodrigo Kede, vice-presidente corporativo da Microsoft, e Tânia Cosentino, presidente da Microsoft Brasil, e Hugo Barreto, diretor de Investimento e Desenvolvimento Social da Vale. O investimento da Microsoft é uma das ações apoiadas pelo programa All for Good, em que a gigante da tecnologia coloca à disposição US$ 165 milhões (R$ 865 milhões), por cinco anos, para fornecer financiamento, tecnologia e especialização para indivíduos e ONGs

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Segundo Barreto, da Vale, a parceria “deve contribuir para inverter a lógica do monitoramento da floresta em pé”. Segundo ele, com os dados sobre as ilhas de risco de desmate, bancos e outros organismos que queiram trabalhar com iniciativas de prevenção podem fazer projetos de preservação “olhando para a frente”.

Membro da tribo Kayapó caminha pela rodovia BR163, durante protesto contra o desmatamento ilegal, em Novo Progresso, no Pará. Foto: Carl De Souza / AFP 

Até o fim de 2021, segundo os dados apresentados por Barreto, o Fundo Vale vai investir R$ 100 milhões em arranjos florestais para recuperar 6 mil hectares, a maior parte na Amazônia, gerando mais de mil empregos no campo. De US$ 23 bilhões (cerca de R$ 120 bilhões) em minério de ferro, segundo Barreto, US$ 13 bilhões (cerca de R$ 63 bilhões) vieram da produção da Vale no Pará. 

“Temos lá (na Amazônia) a maior mina de ferro do mundo, que está dentro de uma Flona (Floresta Nacional) de Carajás”, afirmou Barreto. A exploração mineral, acrescenta, não chega a atingir nem 3% da Flona, que é uma área protegida federal. Essa unidade é uma das poucas que seguem preservadas na região, segundo Barreto. “O resto foi destruído por várias atividades, como criação de gado, extração de madeira, garimpo ilegal, que, inclusive, muita gente confunde com mineração”, disse Barreto.

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“A Vale já protege área, em parceria com o ICMBio. A gente tem uma raiz muito forte . Protegemos 1 milhão e 30 mil hectares de florestas em pé. Compromissos públicos já assinados. E lançamos mais 500 mil hectares de proteção e conservação de 2020 até 2030”, contou. “A cada ano, mais 50 mil hectares”, destacou. Essa ação, segundo ele, é parte de uma agenda da empresa de controle de emissão de carbono que deve se estender até 2050.

Nos últimos anos, a cobrança sobre a Vale em relação à preservação ambiental tem crescido, após as tragédias dos rompimentos das barragens de Mariana (2015) e Brumadinho (2019), ambas em Minas Gerais. A primeira estrutura era da Samarco, empresa controlada pela Vale em parceria com a anglo-australiana BHP Billiton; a segunda barragem rompida pertencia à própria Vale. 

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