Os cortes nas emissões de gases de efeito estufa oferecidos pelos países durante a Conferência do Clima, em Copenhague, "claramente não são suficientes para garantir'' que o mundo vai escapar dos efeitos do aquecimento global, afirmou, neste sábado, um importante cientista filiado a ONU. Pesquisadores disseram que as projeções não levam em conta a "ameaça potencialmente importante" da liberação do metano a partir do degelo no Ártico.
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Na conferência, as nações desenvolvidas estão oferecendo reduções nas emissões de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa que vão de 3% a 4% para os Estados Unidos a 20% para a União Europeia, até 2020 em comparação com níveis de 1990. Enquanto análises independentes dizem que os cortes devem ser de 8% a 12%, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), patrocinado pelas Nações Unidas, recomenda uma redução média de 25% a 40%, para manter o aumento da temperatura global abaixo de 2ºC e evitar os piores efeitos do aquecimento global.
"Eu acho que não é claramente suficiente", disse Thomas Stocker, co-presidente do IPCC, sobre os números anunciados até agora. "Nós estamos longe de afirmar que o limite de 2ºC será cumprido." O físico suíço coordena o Grupo de Trabalho 1 do IPCC, que, entre outras coisas, avalia o impacto que as emissões - da queima de combustíveis fósseis, desmatamento e outras fontes - têm sobre as concentrações de gases do aquecimento global na atmosfera e, em seguida, sobre as temperaturas.
Stocker disse a jornalistas que as metas recomendadas pelo IPCC "podem ser 'pedir demais' nesta fase". Mas ele sugeriu que as negociações climáticas devem ter objetivos mais a longo prazo, de décadas, e não períodos de compromisso de curto prazo, com os previstos nas conferências anuais.
Mesmo limitando o aumento da temperatura a 2 graus Celsius, isso não evitaria danos graves, de acordo com o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri. "Nós ainda teríamos a elevação do nível do mar, apenas por meio de expansões térmicas, de 0,4 a 1,4 metros", disse.
Stocker reconhece que as projeções do IPCC não incluem um ponto de inflexão em potencial para o metano aprisionado abaixo da camada de gelo do Ártico, um poderoso gás de efeito estufa que seria lançado na atmosfera com o derretimento do gelo permanente. A matéria vegetal e animal sepultada há milênios embaixo do solo entraria em decomposição assim que o gelo descongelasse, produzindo dióxido de carbono e metano, muitas vezes mais poderoso que o CO2 no aquecimento da atmosfera.
O metano também poderia ser lançado na atmosfera com o aquecimento dos depósitos de hidratos de metano nos oceanos, formações subterrâneas profundas nas quais moléculas de metano se encontram presas em cristais de água congelada. "[A questão do metano] É potencialmente muito importante",diz Richard Betts, do Met Office Hadley Center, centro britânico de estudos sobre mudanças climáticas. "O tamanho das reservas não é conhecido por completo e não são capturados plenamente em nossos modelos [simulações computadorizadas usadas para projetar as mudanças climáticas]."
Em particular, os pesquisadores russos na Sibéria têm se mostrado alarmados com o potencial do metano, alertando para um possível aumento nas emissões no hemisfério norte, onde a Terra está aquecendo mais, o que aumentaria em vários graus a temperatura global provocando consequências imprevisíveis para o clima. Porém, outros cientistas dizem que o metano aprisionado pode demorar séculos para ser libertado.
"Nós realmente não sabemos o suficiente sobre o metano", afirma o climatologista do Hadley Center, Vicki Pope. De acordo com a instituição britânica, as pesquisas intensivas sobre o metano aprisionado no Ártico pode permitir que o assunto seja incluído nas previsões do Hadley Center no prazo de cinco anos. No ano passado, seis laboratórios dos Estados Unidos lançaram uma pesquisa conjunta sobre a rápida liberação de metano e, em julho, o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri, pediu à rede científica que se concentrasse nas "mudanças climáticas bruscas e irreversíveis" do derretimento do gelo permanente. A próxima avaliação periódica do relatório do IPCC está prevista para 2013. "Estamos caminhando em direção a um precipício, no escuro", diz Richard Betts, sobre as incógnitas do clima. "O precipício está lá fora, em algum lugar, você não sabe onde ele está, e, por isso, faz mais sentido parar."