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Mais de R$ 100 milhões repassados ao Ibama para fiscalização da Amazônia estão parados

Recursos de mais de R$ 70 milhões do Fundo Amazônia que já estavam liberados para o Ibama e mais de R$ 35 milhões provenientes da Lava Jato ainda não foram usados este ano, mesmo em meio à alta do desmatamento no bioma

Por Giovana Girardi
Atualização:

SÃO PAULO - Pelo menos R$ 108 milhões que poderiam estar custeando ações de fiscalização do Ibama na Amazônia ainda não foram usados neste ano, mesmo com a alta do desmatamento na região, conforme levantamento feito pelo Estadão no Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento e no site do Fundo Amazônia.

O órgão ambiental ligado ao Ministério do Meio Ambiente tinha à disposição no início do ano quase R$ 73 milhões do Fundo Amazônia que foram destinados para o Projeto de Fortalecimento do Controle e do Monitoramento Ambiental para o Combate ao Desmatamento Ilegal na Amazônia (Profisc). 

Ibama, principal órgão do governo federal na proteção da Amazônia, perdeu 45% dos fiscais em 10 anos. Foto: Vinícius Mendonça/Ibama

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Uma verba de R$ 140 milhões havia sido liberada para o Ibama em abril de 2018 para ser usada no período de 36 meses. Até dezembro do ano passado foram desembolsados R$ 67 milhões, mas neste ano não houve nenhum uso do recurso restante.

Esse dinheiro, como já havia sido liberado em 2018 pelo fundo, não foi afetado pela paralisação dos recursos do Fundo Amazônia pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, no ano passado. Depois disso, os próprios doadores – Noruega e Alemanha – também interromperam os repasses em decorrência da alta de desmatamento desde o ano passado, mas tampouco isso influiu no recurso do Profisc.

O repasse é voltado principalmente para o pagamento de contratos com helicópteros e caminhonetes do Ibama que atuam na Amazônia. Nesta sexta-feira, o chefe do Centro de Operações Aéreas do Ibama, Everton Almada Pimental, foi exonerado do cargo. Ele teria se posicionado contrariamente a uma decisão do órgão de reduzir o número de aeronaves usadas pelo Ibama.

"O Fundo Amazônia vem financiando o custeio da locação dos helicópteros e caminhonetes que atuam na fiscalização do Ibama na Amazônia desde o final de 2016, por meio do Profisc. Esses recursos foram fundamentais para assegurar a fiscalização na Amazônia durante a minha gestão no Ibama. A fiscalização do desmatamento no bioma teria parado sem esse aporte do fundo", disse ao Estadão Suely Araújo, ex-presidente do Ibama na gestão Temer e especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima.

"Se o Ibama não está usando todos os recursos disponibilizados pelo Profisc 1-B, provavelmente as operações estão ocorrendo em número aquém do necessário. O uso de apenas 48% dos recursos até agora evidencia insuficiência da fiscalização", complementou.

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Segundo a especialista, o Fundo Amazônia é ferramenta "importantíssima" para o controle do desmatamento na Amazônia. "É inaceitável termos mais de R$ 1,5 bilhão depositados sem uso lá, sem contratação, assim como é inaceitável não usar todos os recursos contratados, como está ocorrendo no Profisc 1-B. Em 2020, o Ibama ainda não usou nada dos recursos do projeto", disse em referência ao valor total paralisado no Fundo Amazônia.

Lava Jato

Outro recurso ainda pouco usado neste ano é o proveniente do fundo da Lava Jato. O Ibama recebeu R$ 50 milhões do fundo para usar em prevenção, fiscalização, combate e controle ao desmatamento ilegal e a incêndios florestais na Amazônia. Até esta sexta-feira, 24, apenas R$ 13,9 milhões haviam sido liquidados. 

Salles enviou um ofício em 29 de junho ao ministro da Economia, Paulo Guedes, pedindo o uma verba de R$ 230 milhões. Esse valor, proveniente também da Lava Jato, foi depositado para o ministério, mas depois foi repassado aos Estados da Amazônia por decisão do Supremo Tribunal Federal.

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O ministro disse no ofício que, sem o dinheiro, o governo ficará exposto no período em que mais necessita de força para executar ações de prevenção nas florestas. Salles se referiu principalmente ao combate às queimadas, que têm seu auge entre agosto e outubro.

Desde o início do ano, o desmatamento na Amazônia mantém as tendências de alta iniciadas no ano passado. A partir de maio de 2019, todos os meses apresentaram alertas de desmatamento superiores ao mesmo mês do ano anterior. Dados do sistema Deter, do Inpe, indicam que de 1º de agosto do ano passado até o dia 15 de julho, 8.282 km² foram perdidos. A devastação já supera em 21% a observada entre 1º de agosto de 2018 e 31 de julho de 2019 –  6.844 km². 

Este é o período em que o desmatamento anual é medido na Amazônia. Faltando apenas 15 dias para os dados serem computados, este julho já o segundo pior junho da série, com 734 km².

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O Ibama e o Ministério do Meio Ambiente foram procurados pela reportagem, mas não se posicionaram até o momento sobre por que os demais recursos já disponíveis não foram usados. Se eles se manifestarem, a reportagem será atualizada.

Ações contra o ministério

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No início de junho, os partidos PT, PSB, PSOL e Rede e organizações não governamentais entraram com três ações no STF e na Justiça Federal questionando atitudes e omissões do Ministério do Meio Ambiente

Uma delas considerou que o governo coloca a floresta amazônica e o clima global em risco ao congelar o Fundo Amazônia e o Fundo Nacional sobre Mudanças Climáticas (Fundo Clima).

De acordo com informações levantadas pelo grupo, o Fundo Amazônia tem R$ 1,5 bilhão parado desde janeiro do ano passado, recurso esse que poderia estar sendo usado para o combate ao desmatamento. "Com isso, o governo federal, que sempre usa a falta de recursos para justificar a inação na política ambiental e nas ações voltadas à questão climática, deixa de usar os recursos", apontou o grupo em nota divulgada à época.

Sobre o Fundo Clima, estabelecido em 2009 para financiar ações de mitigação e adaptação em suas modalidades, também havia uma verba importante disponível que não foi empenhada.

"Em 2019, havia autorização orçamentária para aplicação de R$ 8,050 milhões não reembolsáveis no fomento a estudos, projetos e empreendimentos. No fechamento do ano, foram empenhados pouco mais de R$ 718 mil, mas sem registro ainda de liquidação. Quanto aos recursos reembolsáveis, geridos pelo BNDES, estavam disponíveis mais de R$ 500 milhões, mas só cerca R$ 348 mil foram empenhados", relatou o grupo.

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