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Guardiãs da biodiversidade

Manter as matas em pé é um excelente negócio para o País, inclusive sob o ponto de vista econômico – ainda assim, a destruição continua avançando em ritmo recorde

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Por Redação
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Divulgação 

Com cabelos vermelhos e pés virados para trás, o Curupira é uma das lendas mais conhecidas do folclore brasileiro, herdada da tradição oral indígena. Pode-se dizer, também, que é um ícone do ambientalismo no País, pois sempre foi descrito como um grande defensor dos animais e das florestas, empenhado em atormentar e castigar os agressores da natureza.

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Nada mais justo, portanto, que o Dia do Curupira, 17 de julho, se tornasse também o Dia Nacional de Proteção às Florestas, parte do calendário oficial do Ministério do Meio Ambiente. A data ganha relevância neste momento em que, mais do que nunca, as florestas brasileiras estão precisando de proteção – e de protetores da vida real, como eram o indigenista Bruno Araújo Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips, assassinados em junho, durante uma incursão pelo Vale do Javari, na Amazônia.

Proteger as florestas é zelar pelo futuro do Brasil e do planeta, pois elas contribuem para frear o ritmo de evolução da temperatura média global e dos seus efeitos tão ameaçadores, como o aumento do nível dos oceanos e a maior ocorrência de eventos climáticos extremos. Além disso, as florestas asseguram a manutenção dos estoques de água doce e guardam boa parte da biodiversidade do planeta.

Promessa vazia?

Os benefícios de manter as florestas em pé se estendem ao campo econômico, pois é potencialmente muito mais lucrativo conservá-las do que destruí-las. Para que essa equação se consolide, no entanto, é preciso conscientização e ação por parte dos governantes e dos investidores. “Assim como ocorre com todo setor, a economia que valoriza a biodiversidade e a floresta em pé depende de muito investimento em pesquisa, mudança regulatória e crédito para se estabelecer de fato”, diz a gerente de Portfólio do Instituto Escolhas, Jaqueline Ferreira. “Precisamos mudar a direção dos investimentos públicos e privados para a economia que está aliada à conservação da biodiversidade e à geração de renda com os produtos e serviços da floresta.”

Durante a COP-26, a Conferência do Clima das Nações Unidas realizada no final do ano passado em Glasgow, Escócia, o governo brasileiro assumiu o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2028, como parte da meta de zerar as emissões líquidas de Gases de Efeito Estufa (GEE) até 2050. A realidade demonstra, no entanto, que o País está caminhando na direção inversa.

De acordo com o sistema Deter (Detecção de Desmatamento em Tempo Real), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o primeiro semestre do ano foi o pior já registrado na Amazônia desde o início da série histórica, em 2016. Somente em junho, os alertas de desmatamento chegaram ao recorde de 1.120 km2. Com isso, o acumulado do semestre foi de 3.988 km2, patamar 10,6% superior ao do mesmo período de 2021. “O bioma está cada vez mais perto do ponto a partir do qual a floresta não conseguirá mais se sustentar, nem prover os serviços ambientais dos quais nosso país depende”, avalia a gerente de Ciência do WWF-Brasil, Mariana Napolitano.

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Círculo vicioso

Se não for interrompida urgentemente, a escalada da destruição causará prejuízos devastadores também para a economia. O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) chama a atenção para o risco de “agrossuicídio”. Trata-se de um círculo vicioso em que a expansão das fronteiras agrícolas, por meio da remoção de vegetação nativa, reduz a umidade e as chuvas da região, levando à alteração nos ciclos hídricos e hidrológicos.

No final das contas, a queda na produção de alimentos vai superar com folga os ganhos trazidos inicialmente pela expansão das áreas dedicadas à atividade. “Estima-se que o desmatamento, no ritmo atual, pode causar perdas agrícolas de cerca de US$ 1 bilhão anualmente até 2050. Além disso, comprometeria a segurança alimentar da população brasileira”, descreveu a instituição num relatório recente.

O bioma está cada vez mais perto do ponto a partir do qual a floresta não conseguirá mais se sustentar, nem prover os serviços ambientais dos quais nosso país depende”

Mariana Napolitano, Gerente de Ciência do WWF-Brasil

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