Floresta não pode ser instrumento de 'jogo político', diz chefe da ONU

Diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente afirma que 'mundo vive seu maior desafio' e 'novo modelo econômico' terá de ser estabelecido para enfrentar as mudanças climáticas

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Por Jamil Chade
Atualização:

GENEBRA - A preservação das florestas brasileiras não pode ser transformar em "um jogo político" para atender a interesses partidários ou do setor privado. O alerta é do número 1 da ONU para o Meio Ambiente, Achim Steiner. Em entrevista exclusiva ao Estado, o diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente aponta que o novo Código Florestal no Brasil está sendo alvo de um acompanhamento internacional e seus sucessos e fracassos poderão marcar o debate. "Poderemos tirar lições a todo o mundo com base no que vai ocorrer no Brasil", disse. 

Em Genebra para um debate sobre a relação entre o comércio e a proteção ambiental, Steiner foi contundente: "O mundo vive seu maior desafio" e um "novo modelo econômico" terá de ser estabelecido para enfrentar as mudanças climáticas. Eis os principais trechos da entrevista:

O número 1 da ONU para o Meio Ambiente, Achim Steiner Foto: EFE/Martial Trezzini

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A ONU acredita que o trabalho do Brasil para frear o desmatamento tem sido suficiente?

Existe um reconhecimento por parte da comunidade internacional do enorme esforço feito pelo Brasil durante os últimos anos para frear o desmatamento. Isso é algo incontestável e que precisa ser reconhecido por todos na comunidade internacional. O que o Brasil fez nos últimos dez anos não foi apenas reduzir as emissões de CO2 em comparação ao padrão que existia. Também preservou uma parcela significativa da riqueza econômica e ecológica do País. 

E quais são os desafios a partir de agora?

O desafio está relacionado com o novo Código Florestal. Houve muito debate sobre essas novas leis, tanto no Brasil como no resto do mundo. Acho que, sob a gestão da ministra do Meio Ambiente Izabela Teixeira, estamos agora todos de olho sobre como esse novo Código Florestal vai ser traduzido em uma estratégia transparente, eficiente e que possa proteger florestas, inclusive fora da Amazônia. 

E quais são as primeiras constatações da comunidade internacional em relação ao novo Código Florestal?

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Os primeiros sinais apontam para um enorme progresso no estabelecimento de condições, mapeamento e o envolvimento dos governos locais. Mas, de novo, precisamos acompanhar com grande interesse como é que isso vai progredir. Talvez veremos dali sair muitas outras lições para outros países. Poderemos tirar lições para todo o mundo com base no que vai ocorrer no Brasil. Como sempre, as florestas também são assuntos econômicos e políticos. Em certos momento, se estão alinhadas aos objetivos da sustentabilidade, elas podem gerar muito entusiasmo. Mas se elas se transformam em interesses escondidos ou em um instrumento do jogo político na arena da política doméstica, então podem danificar o progresso. Mas isso é natural de todas as sociedades. Só espero que, no Brasil, a sustentabilidade prevaleça. Sei que a sociedade brasileira quer muito que o progresso em manter a riqueza ecológica da nação seja mantido, ao mesmo tempo garantir que o desenvolvimento possa ocorrer. Mas o desenvolvimento sustentável. Isso é o motivo pelo qual a ONU está engajada com o Brasil para garantir uma economia mais verde e que nos de mais esperanças para o futuro.

O Brasil não apresentou seus compromissos de redução de emissões de gases, como deveria ter feito se seguisse o acordo com a ONU?

Não. A data para a apresentação era abril. Mas muitos países vão apresentar nos próximos meses. Claro, quanto mais cedo melhor. Mas o momento crítico é que seja antes da Conferência do Clima de Paris, no final do ano. Todos os países devem dizer o que vão fazer e como poderemos medir progresso. 

O Brasil publicar ou não suas metas é algo que pode ser imitado por outros países?

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O Brasil vai publicar. O Brasil é parte do acordo e já demonstrou que pode tomar medidas importantes. Acredito que seja mais uma questão da ambição, da eficiência de energia no setor produtiva da indústria. 

Como o senhor define o momento em que a comunidade internacional se encontra no debate ambiental?

Vivemos o maior desafio de nossas economias. Precisamos de uma nova economia que possa permitir padrões de desenvolvimento sustentável diferentes do que existiam. Até nos países emergentes já está claro que a não preservação gera um risco para o desenvolvimento. O mundo vive seu maior desafio. Um terço da humanidade vai viver em locais com problemas de abastecimento de água em 2020. O mundo gasta mais de US$ 500 bilhões para subsidiar o setor de combustíveis fósseis e não são os mais pobres que se beneficiam disso. Mas também existem grandes oportunidades e aposto na habilidade do ser humano. O comércio de bens ambientais está projetado para ter uma explosão, atingindo em 2020 mais de US$ 3 trilhões. As oportunidades para promover essa mudança existem.

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