Em 4 anos, secas e inundações afetam 55,7 milhões de brasileiros

Relatório da Agência Nacional de Águas aponta prejuízo de R$ 9 bi por ano com desastres naturais

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Por André Borges
4 min de leitura

BRASÍLIA, FORTALEZA E SOROCABA - Estiagens, secas, enxurradas, inundações. Os fenômenos naturais que sempre marcaram diferentes regiões do País, que vive situação de estresse hídrico, nunca expuseram cenários tão extremos como os ocorridos nos últimos anos. Entre 2013 e o ano passado, os desastres naturais afetaram 55,7 milhões de pessoas - mais de 25% da população nacional. No total, as perdas são R$ 9 bilhões por ano.

Castanhão.Maior reservatório de água do Ceará chega ao volume morto pela primeira vez desde 2002; no sertão, moradores recorrem a carros-pipa Foto: KD Júnior/Agência Diário - 22/11/2017

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Os dados são do relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil 2017, feito a cada quatro anos pela Agência Nacional de Águas (ANA), ao qual o Estado teve acesso. O estudo aponta que, de 2013 ao ano passado, 78% dos 1.794 municípios do Nordeste decretaram, ao menos uma vez, situação de emergência ou estado de calamidade pública por causa da seca extrema que castiga a região desde o fim de 2012. 

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Outros 2.641 municípios, 47,5% das cidades do País, decretaram emergência ou calamidade por causa de alagamentos, enxurradas e inundações.

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Entre 2013 e 2016, 48 milhões de pessoas foram diretamente afetadas por secas e estiagens no Brasil. Outras 7,7 milhões sofreram os efeitos das cheias. O ano de 2016, que já entrou para a história como o mais crítico para seca, pode ser vencido por 2017. “Este ano deve se confirmar como o de pior período chuvoso, o mais seco desde 1931, quando começou a série histórica”, diz Joaquim Gondim, superintendente de operações e eventos críticos da ANA.

Antes restrita a áreas rurais e pequenos distritos, a escassez de água chega agora às cidades maiores no Ceará. Em Quixeramobim, município do sertão a 203 quilômetros de Fortaleza, a população só tem água nas torneiras um dia a cada cinco nos bairros da periferia. 

Comerciantes precisam contratar carros-pipa para manter a higiene dos estabelecimentos. “Cada pipa de mil litros custa uns R$ 30. Isso acaba embutido no preço das mercadorias. O comércio local está numa situação desoladora. Fazia muito tempo que não via assim”, conta o professor Ítalo Câmara, que mora no local. 

Em 2012, 540 municípios do Nordeste eram atendidos por 3 mil carros. Quatro anos depois, em 2016, esse número mais que dobrou, chegando a 6.788.

A quantidade e a intensidade dos recentes eventos extremos relacionados com a água, especialmente de seca, demonstram, ao contrário do que imaginamos, a nossa fragilidade diante desses fenômenos climáticos.

Vicente Andreu, diretor-presidente da ANA

Maior reservatório do Ceará, o açude Castanhão atingiu seu volume morto - quando a água fica abaixo do nível de captação - pela primeira vez desde que foi inaugurado em 2002. Embora o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca confirme, o Estado nega que o Castanhão esteja no volume morto e diz que a captação de água poderá ser feita até janeiro.

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“Para além das questões climáticas, estamos colhendo frutos de muitas décadas de falta de gestão”, diz Anivaldo Miranda, presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, o principal rio que passa pelo Nordeste. Para resolver o problema, ele defende recuperar matas ciliares e combater a erosão, entre outras ações. 

Entre 2014 e 2016, foram estudados pela ANA 204 reservatórios de água do semiárido, que atendem mais de 10 milhões de habitantes. Apenas 85 reservatórios têm capacidade para atender novas demandas e os 119 restantes operam no limite.

Temporais

Já em Salto, no interior paulista, os moradores convivem com inundações. O comerciante Luiz Carlos Ganzano, de 55 anos, é obrigado a tirar de 20 a 30 dias de férias forçadas todo ano. Quando o nível do Rio Tietê começa a subir, ele fecha as portas de seu bar e vai para casa. Este ano, isso já aconteceu dez vezes. “Quase sempre a rua fica coberta pela água com lama e espuma por vários dias”, conta. 

Em março, a enchente deixou 30 casas alagadas - duas caíram. No ano anterior, a água já havia coberto áreas turísticas. A prefeitura de Salto disse que a Defesa Civil monitora pontos banhados pelo Tietê e, quando há alerta de aumento no nível do rio, informa os moradores e isola as áreas de risco. 

Para os especialistas da ANA, as mudanças drásticas nos padrões de chuvas são indícios das mudanças climáticas no País, cenário que tem alterado o mapa hidrológico. Esse processo intensificou-se nos últimos quatro anos, mas já se desenhava há pelo menos duas décadas. /COLABORARAM JOSÉ MARIA TOMAZELA e CARMEN POMPEU

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