PUBLICIDADE

El Niño aumentará número de tempestades no Sudeste, diz Inpe

Estudo mostra que, ao contrário do que acontece em anos de ocorrência, em 2016 tempestades não se limitarão à Região Sul

Por Fabio de Castro
Atualização:
Temporais tendem a se intensificar Foto: AFP PHOTO

SÃO PAULO - Nos anos em que o fenômeno El Niño ocorre de forma moderada, fortes tempestades atingem a Região Sul do Brasil. Mas, no verão de 2016, esses temporais deverão englobar todo o Sudeste, graças à intensidade extrema do El Niño que teve início em julho. A conclusão é de uma pesquisa inédita realizada pelo Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgada nesta terça-feira, 17.

PUBLICIDADE

O El Niño se caracteriza por um enfraquecimento dos ventos alísios - que sopram na faixa equatorial do planeta, no sentido leste-oeste - e pelo aquecimento anormal do Oceano Pacífico, que provoca mudanças nas correntes atmosféricas, afetando todo o clima global.

Nesta segunda, a Organização Meteorológica Mundial (OMM), ligada à ONU, divulgou que o El Niño de 2015 se fortalecerá antes do fim do ano e poderá se tornar o mais forte já registrado. Segundo a OMM, este El Niño já é "forte e maduro" e o mais intenso dos últimos 15 anos. As ocorrências mais intensas do El Niño na história foram registradas em 1973, 1983 e 1998. 

De acordo com o coordenador do Elat, Osmar Pinto Junior, já se sabia que nos anos de El Niño, a tendência é que a quantidade de raios e tempestades aumente no Sul e diminua no Nordeste e Norte. Mas o Sudeste fica em uma região de transição na qual é difícil fazer qualquer previsão. "O nosso estudo mostrou que essa região de transição se moverá para o norte e o aumento de tempestades, que em anos de El Niño fica restrito ao Sul, desta vez ocorrerá em toda a região que vai do Rio Grande do Sul até Brasília e a divisa entre Mato Grosso do Sul e Mato Grosso", disse Pinto Junior ao Estado.

O novo estudo, de acordo com Pinto Junior, não se baseou em modelos climáticos e sim em resultados observacionais da frequência de tempestades registrada desde 1950 nas estações de medição situadas em aeroportos brasileiros.

"Fizemos uma correlação dessas tempestades com aspectos meteorológicos de grande escala - em especial o aquecimento dos oceanos Atlântico e Pacífico", disse. Em 2015, segundo ele, a situação do Atlântico está dentro das médias históricas, mas o Pacífico está sujeito a um El Niño de grande intensidade - o fenômeno será no mínimo o terceiro mais forte dos últimos 65 anos, depois dos eventos de 1983 e 1998. 

"Para o verão de 2016, o estudo prevê um aumento na ocorrência de tempestades em relação ao último verão: 20% a mais nas regiões Sul e Sudeste e 10% a mais na Região Centro-Oeste", declarou o cientista.

Publicidade

Para realizar o estudo, os pesquisadores analisaram dados de tempestades desde 1950 e cruzaram com os dados de ocorrência de El Niño. Mas, ao contrário de estudos anteriores, os dados de anos de El Niño "forte e moderado" foram analisados de forma isolada dos dados de El Niño "muito forte".

"Analisamos separadamente para verificar se os padrões que conhecíamos - de aumento das tempestades apenas no Sul - valiam também para os anos de El Niño considerados superfortes, como o deste ano. Fomos surpreendidos. Nos quatro anos de El Niño superforte, a região de transição se movia para cima", disse Pinto Junior. 

Com a descoberta, os cientistas puderam prever que, no verão de 2016, o clima do Sudeste se comportará como o do Sul em outros anos de El Niño. 

"Com isso, teremos uma frequência maior de tempestades fortes não só no Sul, mas também no Sudeste e parte do Centro-Oeste, especialmente em janeiro e fevereiro. A região de transição, que normalmente fica no Sudeste, foi deslocada para o norte do Mato Grosso do Sul. Dali para o norte, os efeitos do El Niño não serão sentidos. Mas dali para o sul, o El Niño aumentará os temporais e vendavais fortes", declarou.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Os dados da Rede Brasileira de Detecção de Descargas Atmosféricas (BrasilDAT) do último trimestre (agosto, setembro e outubro), já sob o efeito do El Niño, confirmam estas tendências. "Comparamos as regiões Sul e Sudeste nesses meses e vimos que o resultado é consistente. Tivemos nos últimos três meses aumento de raios de 60% na Região Sul e de 52% no Sudeste. Isso indica que o efeito desse El Niño extremos já estão sendo sentidos na Região Sudeste", explicou.

No Sudeste, nos últimos três meses foram registradas 480 mil descargas elétricas atingindo o solo, contra 310 mil descargas no mesmo período de 2014, um aumento de 52%. "Esse resultado é preocupante. Se os raios aumentaram mais de 50% no Sudeste e o número de tempestades subiu 20% na região, isso sugere que o El Niño não apenas está aumentando a frequência das tempestades, mas também sua intensidade", disse.

O aumento das tempestades - caracterizadas por fortes chuvas convectivas - deverá trazer um pouco de alívio para a situação hídrica do Sudeste em relação aos anos anteriores, segundo Pinto Junior. "A previsão de chuvas dos modelos do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Inpe aponta para chuvas acima da média histórica em dezembro e janeiro - o que é um resultado coerente com nossas previsões", afirmou.

Publicidade

"Os nossos dados de aumento das tempestades com raios, combinados com os dados demográficos da Região Sudeste, também nos levam a pensar que o número de mortes por raios no próximo verão pode aumentar, se não alertarmos adequadamente a população sobre os efeitos do El Niño", disse Pinto Junior. 

O maior número de tempestades também atingirá Minas Gerais, incluindo a região de Mariana, onde o rompimento de duas barragens de rejeitos da mineradora Samarco lançaram 62 milhões de metros cúbicos de lama sobre um sistema de rios de mais de 800 quilômetros. Chuvas fortes nessa área tendem a dissolver novos volumes de lama, que poderão, segundo especialistas, tornar a provocar desabastecimento de água em cidades mineiras e capixabas, intensificando a contaminação do oceano no litoral do Espírito Santo.

Publicidade