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Árvore da Mata Alântica está morrendo em massa no litoral norte de SP

Os guapuruvus começaram a morrer há 3 anos e hoje são apenas esqueletos cinzas em meio a mata; pesquisadores suspeitam do ataque de um fungo

Por Giovana Girardi
Atualização:

SÃO SEBASTIÃO - O paredão de Mata Atlântica que recepciona quem chega a São Sebastião, no litoral norte paulista, está diferente. O verde tradicional está salpicado de cinza. Aqui e ali, em meio a copas frondosas, esqueletos ressequidos perturbam a vista e denunciam um problema ambiental: os guapuruvus estão morrendo.

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Espécie tradicional daquela vegetação, essa árvore (Schizolobium parahybae), que tende a ficar mais alta que a maioria, é facilmente reconhecida pela florada amarela que colore a mata no final do inverno. Há uns três anos, de repente, começaram uma a uma a perder as folhas, secar, descascar e morrer.

O problema foi inicialmente observado no norte de São Sebastião, mas desde então já se alastrou até as praias ao sul do município, atravessou o mar e atingiu Ilhabela e já foi detectado no Jardim Botânico, em São Paulo. Ocorre tanto na mata fechada quanto na área urbana e na beira de estradas, ameaçando cair sobre casas e carros.

Sem motivo aparente, o misterioso declínio dos guapuruvus preocupa caiçaras – que tradicionalmente usam árvores caídas ou derrubadas com autorização do órgão ambiental para fazer canoas – e técnicos ambientais, que desconfiavam tanto das mudanças climáticas quanto de alguma praga nova.

“Parece uma nuvem que vem descendo e matando todos os guapuruvus. Atinge quase 100% das árvores por onde passa”, conta o engenheiro agrônomo Mauricio Rubio Pinto Alves, da Casa da Agricultura de São Sebastião e Ilhabela.

Ele e o engenheiro florestal Silas Barsotti Barrozo, da Secretaria do Meio Ambiente do Estado, recorreram ao pesquisador Francisco Zorzenon, do Instituto Biológico, especialista em pragas urbanas e agrícolas.

O biólogo propôs uma hipótese ainda não confirmada: um pequeno besouro (uma microcoleobroca da espécie Platypus sp), comum na Mata Atlântica, estaria inoculando um fungo nos guapuruvus que seria o responsável pela sua morte.

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Segundo Zorzenon, o besouro perfura o tronco da árvore, põe seus ovos, e as larvas que nascem se alimentam do tecido lenhoso da árvore. Junto com os ovos, os besouros também inoculam um fungo dentro da árvore, que servirá depois de complemento alimentar para as larvas. A suspeita é que este fungo leve a árvore à morte.

Para testar essa teoria, ele espalhou armadilhas pelos guapuruvus para coletar as brocas. “Ao analisarmos no laboratório vimos que alguns deles realmente carregam um fungo que é patogênico mesmo. Mas se é ele que tá causando o problema ainda não sabemos e continuamos investigando”, conta.

Zorzenon lembra que esse comportamento das brocas é comum, então ou se trata de um fungo novo, mais agressivo, ou é um organismo conhecido, mas que agora, por algum motivo, as árvores estão mais suscetíveis a ele. “Pode haver algum estressor ambiental”, explica.

Impacto ecológico e social. O guapuruvu é uma espécie de árvore pioneira, ou seja, quando uma área de mata é aberta, ela é a primeira a ocupar aquele solo, protegendo-o para que outras espécies possam se desenvolver. Por isso ele não vive muito tempo, chega a uns 60 anos no máximo. “É natural no processo de dinâmica de sucessão das árvores que ele vá diminuindo com o amadurecimento da floresta. Mas o que está acontecendo agora é completamente diferente”, afirma Barrozo.

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“Há relatos feitos por caiçaras de que há 50 anos ocorreu algo parecido em Ubatuba. Também houve um registro há uns anos na Ilha Grande (RJ). Então seria algo cíclico ou um problema novo? Será que os brotos que estão surgindo serão imunes ou em três anos também vão morrer? Aí temo que poderemos ver a extinção dos guapuruvus”, complementa Alves.

Os caiçaras, por sua vez, estão aflitos com a possibilidade de perder a árvore que usam tradicionalmente. “Acho que eles vão voltar, vemos vários brotinhos nascendo, mas até atingir o tamanho para virar canoa, não vai ter mais ninguém aqui para poder usar”, lamenta Josias Marcelino de Matos, que há 55 anos trabalha no feitio de canoas.

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