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Após óleo, estudo indica redução do nº de espécies de invertebrados em praias da Bahia

Pesquisa analisou presença de invertebrados, como moluscos e crustáceos, em quatro praias; investigação revelou embranquecimento de corais

Por Bruno Luiz
Atualização:

SALVADOR - Estudo feito pelo Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) apontou redução de quase 66% no número de invertebrados bentônicos vivos (como corais, moluscos, crustáceos, polvos e lagostas) em quatro praias do litoral do Estado, após o derramamento de óleo na costa brasileira. Os corais foram as espécies mais afetadas. Segundo o Ibama, ligado ao Ministério do Meio Ambiente, já foram registrados vestígios de óleo em 772 pontos do litoral, em 10 Estados.

Paguro, crustáceo que usa concha de moluscos como casca Foto: Sol de Maria César Ferreira/Ibio

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Os dados do trabalho foram apresentados nesta segunda-feira, 25. Os pesquisadores compararam os dados de abril e de outubro de quatro praias (Forte, Itacimirim, Guarajuba e Abaí), em uma área de 140 m². A quantidade média de indivíduos caiu de 446 para 151. Ainda conforme a pesquisa, houve queda no número de espécies - de 88 para 47, uma queda de quase 47%.  Procurado, o Ministério do Meio Ambiente informou que não conseguiria comentar o estudo nesta segunda.

As espécies mais afetadas foram os corais, que branquearam mais que o normal. Desde 1995, quando o instituto da UFBA  começou a acompanhar os recifes nas quatro praias, a taxa anual de branqueamento fica entre 5% e 6%. Agora, esse percentual aumentou para 51,92%. 

A cor dos corais também é um fator para atestar a saúde dos invertebrados. "Quando um coral está saudável, fica rosado ou cor de café. Com qualquer distúrbio diferente, o coral pode perder a cor ou ficar totalmente branco”, explica o biólogo Francisco Kelmo, coordenador do estudo. 

O embranquecimento pode levar à morte ou enfraquecer a estrutura reprodutiva das espécies. Um exemplo disso é a espécie Siderastrea stellata, presente apenas no litoral brasileiro. Conhecida por sua resistência, ela foi uma das mais atingidas pelo óleo que se espalhou pelo litoral.

De acordo com Kelmo, o branqueamento pode aumentar, em condições naturais, se houver crescimento na temperatura da água ou aumento na incidência de radiação solar sobre os corais. Como não foi detectada mudança considerável nestes fatores, a presença do óleo foi apontada como explicação para o fenômeno. 

Kelmo alertou que a possível perda de biodiversidade, como indicado no estudo, terá impacto na cadeia alimentar e na reprodução dos animais. “Estes números indicam que houve perda de patrimônio natural, redução no número de animais, redução na diversidade de animais e aumento das doenças/mortalidade nos corais. Assim, compromete a cadeia alimentar, causa desequilíbrio ecológico [...]”, aponta uma das conclusões da pesquisa. Um dos ingredientes para a situação é o fato de que o óleo chegou às praias no início de outubro, justamente no período reprodutivo dos animais, que acontece entre o fim de setembro e fevereiro. Entre os tipos perdidos, estão crustáceos e moluscos - polvos e lagostas estão no grupo e são os mais pescados e consumidos na região, segundo o professor.

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Ecossistema deve levar de 10 a 20 anos para se recuperar, diz especialista

Para Kelmo, o ecossistema deve levar de 10 a 20 anos para se recuperar naturalmente, caso não haja novos desastres para impactar a área. Os impactos na área serão monitorados continuamente pelo instituto, pelo menos nos próximos seis meses. A literatura internacional sobre acidentes com óleo aponta para uma tendência de piora na situação das quatro praias, mas o professor pondera que os ecossistemas do Atlântico Sul costumam se comportar de forma diferente do de outros locais ao redor do mundo.

Em dezembro, os pesquisadores vão analisar a presença do óleo nos recifes submersos, já que, neste primeiro momento, foram estudados apenas os costeiros. O mesmo deve ser feito nos manguezais posteriormente. “Esse fantasma do óleo vai nos assustar por muito tempo. Isso é preocupante”, alertou o biólogo.

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Questionado sobre o perigo de consumo de animais pescados nas áreas estudadas, o professor relembrou que análises recentes feitas pelo governo federal não apontaram riscos de contaminação por ingestão. Mas ponderou que o óleo consumido pelas espécies têm substâncias cancerígenas. “Um agente carcinogênico não tem limite mínimo de exposição. Estou preocupado com a saúde dos animais A dúvida que fica é o envenenamento desses animais, se eles continuam apropriados para consumo."

Kelmo foi autor de um recente estudo que mostrou vestígios de óleo nos aparelhos digestivo e respiratório de 50 animais recolhidos de praias atingidas. Na época, recomendou que a população evitasse comer pescados desses locais. O biólogo disse ainda que é cedo para falar na possibilidade de extinção de espécies, mas admitiu a possibilidade de desaparecimento local de algumas delas. 

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