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Parecer trava obra da Sabesp em Parque da Serra do Mar

Documento elaborado pela Fundação Florestal aponta que estudo da transposição do Rio Itapanhaú previsto como uma das obras para evitar uma nova crise hídrica não dimensiona dano ambiental; um novo grupo de trabalho foi montado para analisar os dados

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Por Giovana Girardi
Atualização:
Parque Estadual da Restinga da Bertioga é uma das áreas que podem ser afetadas pela obra. O local abriga 44 espécies de flora ameaçadas de extinção e de 117 espécies de aves, sendo 37 endêmicas. Crédito: JONNE RORIZ/ESTADÃO Foto: Estadão

Giovana Girardi Fabio Leite

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Uma das principais obras do governo Geraldo Alckmin (PSDB) para evitar nova crise hídrica em São Paulo está travada por questões ambientais. Parecer elaborado pela Fundação Florestal afirma que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) feito pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) sobre a transposição do Rio Itapanhaú para o Sistema Alto Tietê não dimensiona o real impacto da obra na região preservada nem aponta medidas de redução de danos.

A obra, que vai transpor por tubos até 2,5 mil litros por segundo do Ribeirão Sertãozinho, formador do Itapanhaú, para a Represa de Biritiba-Mirim, atinge um dos poucos remanescentes de Mata Atlântica do Estado: os núcleos Bertioga e Padre Dória do Parque Estadual da Serra do Mar, o Parque Estadual Restinga de Bertioga, a Área de Proteção Ambiental (APA) Marinha Litoral Centro e a APA Várzea do Tietê. São regiões consideradas sensíveis e de enorme variedade de vegetação, incluindo florestas, restinga e mangues. Ali também estão presentes diversas nascentes.

O parecer entregue no começo do ano à Companhia Ambiental de São Paulo (Cetesb), responsável por liberar a obra, aponta que o EIA não dá condições para prosseguimento do licenciamento. "São ainda desconhecidos e incalculáveis os efeitos da transposição do Rio Itapanhaú e de sua consequente redução de vazão, que provocará o avanço da cunha salina", aponta o documento, assinado pela assessora técnica Lélia Marino.

"Em face não só da insuficiência de informações ambientais imprescindíveis para sustentar a previsão de impactos do EIA, mas também da falta de propostas de ações mitigadoras para muitas das alterações previstas pelo próprio empreendedor, conclui-se que o estudo apresentado deixa de cumprir seu objetivo de avaliar as consequências ambientais da realização das obras", continua.

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E conclui: "Em que pese o caráter de relevância, emergência e excepcionalidade de que se reveste o projeto apresentado, essa insuficiência de informações impossibilita também propor que sejam impostas ao empreendedor condicionantes para a emissão de licença prévia".

Um outro parecer, feito pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), já tinha sido contrário à obra por levar a um desmatamento de 15 hectares de Mata Atlântica. Conforme noticiado pelo jornal Folha de S. Paulo em 22 de fevereiro, o secretário estadual de Cultura, Marcelo Araujo, no entanto, aprovou o projeto.

O parecer da Fundação Florestal foi encaminhado em 11 de janeiro à Cetesb, que deve analisar o pedido de licenciamento ambiental, pelo então diretor da Fundação Florestal Luiz Fernando Rocha (ele deixou o cargo na quarta, atendendo à decisão do Supremo Tribunal Federal de que membros do Ministério Público não podem ocupar outra função pública).

Conforme o Estado apurou, 15 dias depois, Rocha, a secretária do Meio Ambiente, Patrícia Iglecias, além de técnicos da Cetesb e da Sabesp foram convocados para uma reunião no Palácio dos Bandeirantes para tratar da obra.

Grupo de trabalho. Em 2 de fevereiro, foi criado um grupo de trabalho para reanalisar o EIA e informações adicionais fornecidas pela Sabesp, que divulgou três relatórios complementares após o parecer da fundação. O promotor Ricardo Castro, do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente (Gaema) do Ministério Público Estadual, acompanha o processo de licenciamento e disse que aguarda o novo parecer. Ele recebeu o documento original, avaliou o EIA e o complemento entregue pela Sabesp. "Ainda não houve o convencimento da viabilidade ambiental da obra", disse ao Estado.

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A ONG SOS Mata Atlântica também aguarda o novo posicionamento. "Por mais que a lei permita suprimir vegetação nativa para fins de utilidade pública e interesse social, quanto menos supressão em áreas importantes, como é o caso do Parque da Serra do Mar, melhor. É uma região sensível e que tem muitas nascentes. É um contrassenso cortar floresta, que protege água, se houver outras alternativas, como um outro traçado, por exemplo", afirmou Márcia Hirota, diretora da organização.

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"Existem áreas que já estão impactadas, onde a florestada foi alterada que não tem tanto problema fazer obras. Mas onde ainda está preservado, como é o caso dessa região, é preciso atenção dobrada. Esse foi o tom do parecer da técnica da Fundação Florestal. O poder público tem de ouvir os especialistas", disse.

A Secretaria do Meio Ambiente, à qual a Fundação Florestal é subordinada, informou por meio de sua assessoria de imprensa que o parecer apresentado era inicial e não foi "contrário à obra, mas a alguns aspectos de sua execução". Segundo a nota, isso é uma ocorrência comum em qualquer tipo de empreendimento em processo de licenciamento. "A partir deste parecer, o empreendedor apresentou novas informações e foi criado um grupo de trabalho para seguir a análise do processo."

Para entender. A transposição de água do Rio Itapanhaú para a Represa Biritiba-Mirim foi anunciada pela Sabesp no início de 2015, auge da crise hídrica, para aumentar a entrada de água no Sistema Alto Tietê, o segundo maior manancial que abastece a Grande São Paulo e que também sofreu com a estiagem iniciada em 2014. O rio nasce no alto da Serra do Mar e deságua no oceano na cidade de Bertioga, litoral norte, onde também é feita captação para abastecimento público. A previsão é de que a obra seja concluída em 2018.

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