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Bastidores: Troca em equipe de transição reforça peso do agro sobre ambiente na gestão Bolsonaro

Após escolha de Ricardo Salles para o Ministério do Meio Ambiente, equipe de transição ligada à área foi exonerada nesta sexta; o grupo antigo era mais ligado aos militares, ao contrário do novo, ligado ao núcleo político e ruralista

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Por Giovana Girardi
Atualização:

Após a escolha do advogado Ricardo Salles para chefiar o Ministério do Meio Ambiente, a equipe de transição do presidente eleito, Jair Bolsonaro, sofreu uma mudança no grupo que estava responsável por avaliar a área ambiental.

Foi publicada nesta quinta-feira, 13, a nova composição da equipe. Saiu todo mundo que estava na área ambiental desde o início da fase de transição (alguns colaboravam com Bolsonaro antes mesmo de ele ser eleito) e assumiram três pessoas: o próprio Salles, o agrônomo Evaristo de Miranda, da Embrapa - que foi o primeiro nome cogitado para a pasta e declinou por motivos pessoais -, e o advogado Gilson Machado Guimarães Neto.

Advogado Ricardo Salles foi secretário do Meio Ambiente de São Paulo durante governo de Geraldo Alckmin (PSDB) Foto: Nilton Fukuda/ ESTADÃO

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A equipe anterior, liderada pelo biólogo Ismael Nobre, foi exonerada, e o trabalho que vinha sendo feito, interrompido. A mudança reforça um clima de certo antagonismo que veio à tona nas últimas semanas entre os núcleos militar e político que apoiam o novo governo.

A primeira equipe de transição para a área ambiental tinha o apoio dos militares. Já Miranda e Salles contavam com apoio do agronegócio e do núcleo político. Enquanto o grupo de Nobre trabalhava na proposição de novos caminhos para a política ambiental, se reunindo com representantes do Ministério do Meio Ambiente e agências do setor, Miranda foi convidado por Onyx Lorenzoni, futuro ministro da Casa Civil, a preparar um diagnóstico paralelo sobre o funcionamento dos órgãos ambientais visando sua reformulação.

Todas as reuniões com equipes do MMA, do Ibama, do ICMBio, da Agência Nacional de Águas, por exemplo, foram feitas com o grupo de Ismael. "Era um grupo com uma visão mais de mercado, mas com alguma ligação com a área ambiental e com visões mais razoáveis do que a opção que se apresenta agora", contou ao Estado uma analista ambiental da gestão atual que participou dessas reuniões. "Claramente ganhou espaço agora uma outra visão, mais ligada aos ruralistas", disse.

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Segundo ela, não foi feita nenhuma reunião até o momento de equipes do ministério com o grupo de Miranda que vinha conduzindo o diagnóstico que deve orientar a nova gestão antes mesmo de Salles ser indicado. Ao Estado, Miranda afirmou que uma das conclusões do seu levantamento é o que ele chamou de "hipertofria" do Ministério do Meio Ambiente. Segundo ele, há uma "superposição de um monte de funções que se repetem" nos órgãos, como Ibama e ICMBio. E que o problema central é haver "muito dinheiro para as atividades meio e pouco para as atividades-fim".

A sensação internamente entre a equipe agora exonerada é que prevaleceu os princípios do Ministério da Agricultura sobre os do Meio Ambiente e que o trabalho realizado nos últimos meses será descartado. A imagem foi reforçada por vídeos gravados logo após a nomeação em que Salles aparece ao lado de Nabhan Garcia, presidente da União Democrática Ruralista (UDR) e de Frederico D'Ávila, da Sociedade Rural Brasileira (SRB). "Nós teremos um momento de total sinergia da Agricultura com o Meio Ambiente. Respeito absoluto ao produtor rural com todo o nosso apoio", disse o futuro ministro.

Nabhan endossou a escolha ao dizer que Salles à frente da pasta "significa o fim do estado policialesco e o fim do estado confiscatório em cima de quem trabalha e produz nesse País".

Conversão de multas

A equipe anterior ecoava o discurso de necessidade de colocar um fim no que o presidente eleito chama de "indústria da multa", mas não se mostrava reativa, por exemplo, ao projeto de conversão de multas adotado pelo governo Temer - assunto criticado por Bolsonaro. Pelo projeto, empreendedores com grandes valores de multas a pagar ao Ibama, como a Petrobrás, recebem um desconto de 60% no valor se empregarem o restante em projetos de recuperação ambiental.

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Esses projetos podem ser tocados por organizações sem fins lucrativos, como ONGs, ou mesmo pelo poder público. Essa estratégia foi adotada, num primeiro momento, porque ainda não foi equacionada a logística de repasse do valor para órgãos públicos. Multas pagas caem num fundo do tesouro.

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Na visão do presidente eleito, porém, o decreto que criou essa possibilidade é problemático. "Nós respeitamos o meio ambiente, mas, pessoal, não dá mais para conviver com a indústria da multa", criticou. "Tem decreto que destina 40% das multas para ONGs para preservar meio ambiente. O que vamos fazer com aquele decreto? Cair fora", disse Bolsonaro nesta quarta-feira, 12, em reunião na sede da equipe de transição.

Para o Ibama, que defende a programa, essa é uma forma mais efetiva de aproveitar uma verba que até então ficava parada. A Petrobrás, por exemplo, sempre recorria do pagamento das multas. Agora já liberou R$ 300 milhões. No total, para o primeiro chamamento de projeto, foram arrecadados R$ 1 bilhão para o reflorestamento das bacias do São Francisco e do Parnaíba. O resultados dos projetos que deverão ser contemplados pelo primeiro chamamento devem ser divulgados na semana que vem.

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