Poluição de Manaus pode alterar chuvas na floresta amazônica

Pesquisadores brasileiros e americanos usaram jato para estudar as nuvens e mapear impactos das emissões urbanas na Amazônia

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Por Fabio de Castro
Atualização:

A poluição de Manaus pode causar mudanças no ciclo de chuvas da Amazônia, além de afetar a capacidade da floresta para absorver CO2 da atmosfera – um importante serviço ambiental fornecido pelo bioma. Essas são as principais conclusões de um amplo projeto internacional de pesquisa que mapeia os impactos das emissões urbanas na química da atmosfera da floresta amazônica.

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Lançado no início de 2014, o projeto Green Ocean Amazon (GOAmazon) acaba de ter seus primeiros resultados divulgados. A análise dos dados obtidos foi feita em um workshop realizado recentemente na Universidade Harvard, envolvendo 50 cientistas brasileiros e 50 americanos.

De acordo com um dos gestores do GOAmazon, o físico Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP, o objetivo principal do esforço internacional de pesquisa é investigar os mecanismos físicos de formação de nuvens de chuva, que ainda não são totalmente compreendidos pela ciência. As nuvens da Amazônia, por suas características especiais, influenciam todo o clima do continente.

 Foto: Infográfico/Estadão

Jato. Utilizando pela primeira vez em florestas tropicais um avião a jato de pesquisa da Alemanha, com sensores de alta tecnologia, os cientistas puderam coletar dados a 18 quilômetros de altitude – nos limites da estratosfera – e, com isso, examinar a estrutura molecular das gotas de chuva dentro de nuvens que nunca haviam sido estudadas. Segundo Artaxo, os resultados indicam que a poluição de Manaus levou a concentração de ozônio sobre a floresta a crescer em até 10 vezes – o que poderá reduzir a capacidade das plantas em absorver CO2.

As consequências disso podem ser desastrosas no futuro, caso as emissões urbanas aumentem. Segundo Artaxo, o ozônio dificulta a abertura dos estômatos das folhas das plantas, reduzindo sua capacidade de sequestrar o dióxido de carbono da atmosfera.

Interação química. A alta produção de ozônio, de acordo com Artaxo, é resultado da interação química entre dois tipos de gases: o óxido de nitrogênio emitido pelos carros e pelas diversas usinas termoelétricas instaladas na área urbana de Manaus e os gases orgânicos que são naturalmente lançados à atmosfera pela floresta. 

“Em áreas remotas da Amazônia, a presença de óxidos de nitrogênio é muito pequena e, por isso, a concentração de ozônio também é baixa – da ordem de 8 a 10 partes por bilhão. Mas, com sua frota de 800 mil carros, Manaus emite grandes quantidades desses óxidos, que interagem com os compostos orgânicos voláteis da floresta, produzindo muito ozônio. Nas proximidades da cidade, as concentrações de ozônio observadas foram de 80 a 100 partes por bilhão”, disse Artaxo ao Estado.

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Usina Termoelétrica de Mauá, na região de Manaus, faz parte do sistema energético que abastece o Amazonas Foto: Divulgação

Além de resultar no aumento dos níveis de ozônio, a poluição de Manaus também faz crescer a emissão de partículas de aerossóis – micropartículas que permitem a condensação das gotas no interior das nuvens. Sem a presença de aerossóis, não há precipitação. Mas o excesso dessas partículas também altera as propriedades das nuvens, afetando o delicado equilíbrio em seu interior, que permite a produção efetiva de chuvas.

“A atmosfera da Amazônia tem concentração de 300 partículas por centímetro cúbico. Nas regiões afetadas pelas emissões de Manaus, observamos concentrações de 20 mil a 30 mil partículas por centímetro cúbico. Em estudos anteriores, verificamos que o aumento de partículas leva à formação de gotas de chuva menores e com menor eficiência de precipitação. Isso pode gerar nuvens que se formam, mas não produzem chuva.”

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