O projeto pessoal que ajudou a salvar a arara-azul

Grupo de pesquisadores conseguiu aumentar a população da ave de 1.500 para cerca de 5 mil indivíduos no Pantanal

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Por Giovana Girardi
Atualização:
Foto:Cezar Côrrea Foto:

PANTANAL DE MIRANDA - Outro animal que vem se beneficiando de projetos que aliam conservação com turismo no Pantanal é a arara-azul. A espécie, que chegou a ter apenas 1.500 indivíduos no bioma no fim dos anos 1980 e engrossou a lista de fauna ameaçada de extinção, hoje já soma mais de 5 mil e não é mais considerada em perigo.

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O feito se deu por iniciativa de uma bióloga que, recém-formada, se encantou com a maior arara do Brasil. Era 1987, quando Neiva Guedes visitou o Pantanal para um curso sobre conservação. Lá se deparou com uma árvore seca, apinhada de araras. “Parecia uma árvore de Natal, mas, em vez de bolinhas, tinha araras. Foi paixão à primeira vista. Ouvi do professor que a espécie poderia desaparecer se nada fosse feito. Eu não era pantaneira nem ornitóloga, mas fiquei determinada a fazer alguma coisa”, conta. 

Ela submeteu um projeto à ONG WWF, que na época nem tinha sede no Brasil, e conseguiu um financiamento. “Eu era tão romântica. Pensei que ficaria embaixo de uma árvore observando o dia inteiro e descobriria tudo sobre a espécie. Mas logo alguém me disse que poderia descobrir muito sobre os comportamentos de um casal, mas para saber sobre a espécie teria de rodar. Fiquei viajando de carona. Às vezes passava três, quatro dias em cima de árvore. Alguém me deixava lá às 5 da manhã e me buscava à noitinha.”

Na ocasião, a espécie sofria com o tráfico de animais e também com a perda de hábitat. No trabalho, Neiva descobriu que a arara-azul tem hábitos alimentares muito restritivos. Só come fruto de palmeira acuri e da bocaiuva.

Outra peculiaridade é que ela só bota ovos em cavidades já existentes em troncos de árvores, em geral de manduvi. É o caso de buracos abertos por pica-pau ou um galho que quebra ou antigas colmeias de abelhas. “No começo do estudo, observei que tinha casais querendo se reproduzir, mas não havia muitas cavidades. Vi araras brigando por cavidade”, lembra. Daí surgiu a ideia de criar ninhos artificiais para os animais poderem colocar seus ovos.

Hoje o Projeto Arara Azul, que tem base no Refúgio Ecológico Caiman, monitora com armadilhas fotográficas e pessoalmente cem ninhos naturais e artificiais na região. Mas já foram identificados 428. Trabalha também com educação ambiental, para evitar a caça, e cria estratégias para proteger os filhotes, como colocar anéis metálicos ao redor de árvores onde há ninhos para evitar que alguns predadores, como jaguatiricas, escalem o tronco.

No início deste mês, ainda não era época de reprodução, mas os pesquisadores notaram que as araras já começavam a visitar as cavidades para montar os ninhos. A bióloga Fernanda Fontoura, que nos guiou na visita, conta que a espécie se tornou uma bandeira para conservação. Os ninhos para araras acabam ajudando pelo menos outras 20 espécies, como arara vermelha, mutum, gavião. As espécies se alternam no uso das cavidades, sejam elas naturais ou artificiais.

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A bióloga Fernanda Fontoura, que nos guiou na visita, conta que a espécie se tornou uma bandeira para conservação. Os ninhos para araras acabam ajudando pelo menos outras 20 espécies, como arara vermelha, mutum, gavião. 

Mudança do clima. Em uma árvore visitada pela reportagem, havia uma cama velha de pato do mato, que normalmente entra depois que a arara sai. O animal, porém, protagonizou uma história dramática em Caiman.

“No ano passado, o casal de araras que estava ali se reproduziu mais tarde que o normal, porque tivemos o menor volume de chuvas dos últimos anos na planície. E, quando o pato chegou, o casal ainda estava ali, com filhotes. Na defesa da prole, rolou um assassinato”, conta ela. É por isso que mudanças no regime de chuvas provocadas possivelmente pelas mudanças climáticas começam a preocupar. 

* A repórter viajou a convite do Instituto SOS Pantanal

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