Novas usinas condenam hidrovias

Potencial de navegação no País é de 63 mil quilômetros, mas só 20,6% são usados; usinas a fio d'água vão complicar a situação ainda mais

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Por Renato Andrade e Leonardo Goy
Atualização:

A solução encontrada por técnicos em engenharia do setor elétrico para construir hidrelétricas na Amazônia, sem a necessidade de grandes alagamentos e pânico entre ambientalistas vai dificultar a implantação de hidrovias na região.

 

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Os reservatórios gigantes, utilizados durante anos na construção de usinas, acabavam “corrigindo” as corredeiras e quedas d’água, o que facilitava a navegação. Sem eles, a passagem de barcaças com carregamentos só será feita com a construção, em alguns casos, de um número quase três vezes maior de eclusas – espécie de comporta que permite embarcações subirem e descerem os rios.

 

Para contornar as barreiras ambientais e explorar a capacidade de geração de energia nos rios amazônicos, o setor elétrico abandonou o velho modelo de construção de hidrelétricas e passou a desenvolver projetos conhecidos como usinas fio d’água. Essa nova forma busca concentrar o fluxo do rio para movimentar as turbinas, evitando alagamento de grandes áreas.

 

A hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu (PA), é um exemplo de usina fio d’água. Na década de 70, quando começou a ser estudado, o empreendimento com 11.233 megawatts (MW) de potência resultaria no alagamento de área de 1.200 quilômetros quadrados, o equivalente a mais de dois terços da cidade de São Paulo. Com as mudanças no projeto, a área alagada caiu para 516 quilômetros quadrados.

 

As cinco usinas que o governo pretende construir no Rio Teles Pires (MT) até 2016 também serão feitas pela nova modelagem. Isso vai postergar mais uma vez a construção da hidrovia Teles Pires-Tapajós, o que desagrada produtores rurais da região.

 

Segundo Luiz Antônio Pagot, diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), se o modelo antigo de usina fosse usado em Teles Pires, o governo teria de construir seis hidrelétricas, com uma eclusa ligada a cada projeto, para garantir a navegabilidade dos 1,4 mil quilômetros entre a foz do Tapajós e o município de Nova Canaã do Norte (MT).

 

Pelo novo modelo, o número de eclusas a serem construídas para garantir a navegabilidade subirá para 14. “Esse é o problema do fio d’água. Acrescenta custo. É preciso fazer mais eclusas, trabalhar mais os rios, fazer derrocagem (retirada de pedras), canais de navegação”, diz Pagot.

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Estudos preliminares indicam que, para garantir a navegação do Teles Pires seriam necessários cerca de R$ 14 bilhões em investimentos, ou seja, R$ 1 bilhão para cada 100 quilômetros de rio. O problema é que o potencial de carga a ser transportada é de, no máximo, 5 milhões de toneladas por ano.

 

Prioridades

 

Apesar da vontade de aumentar o transporte de cargas pelos rios, o investimento em rodovias e ferrovias ainda está no topo da lista de prioridades do governo. O potencial de navegação no País é de 63 mil quilômetros, mas só 20,6% são usados. Segundo estimativas da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), as hidrovias respondem por 11% das cargas transportadas pelo País, enquanto as rodovias abocanham 60%.

 

“Não temos recursos para ficar esbanjando e o cobertor é curto”, diz Pagot. “Dar condições de navegação para um rio através de eclusas, barragens, derrocamento e não ter carga para transportar não faz sentido.”

 

A importância das hidrovias também pesa na hora de decidir onde investir. Se o investimento estimado para Teles Pires fosse aplicado no Tietê-Paraná, a quilometragem de navegação no complexo saltaria dos atuais 700 quilômetros para 2,2 mil quilômetros e o volume de carga transportada passaria de 5 milhões de toneladas/ano para 30 milhões. O Tietê-Paraná beneficia regiões em cinco Estados. “Talvez até 2018 a gente esteja com a nova hidrovia do Tietê-Paraná pronta e até 2030 com Teles Pires-Tapajós”.

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