Lama no Rio Doce não afeta comportamento de desova de tartarugas
Primeiros filhotes nasceram, mas ainda não se sabe se eles foram contaminados ou não; análises de sangue, ovos e natimortos investigarão
Por Giovana Girardi
Atualização:
SÃO PAULO - Quando a lama de rejeitos de minério da Samarco chegou ao mar do Espírito Santo após viajar pelo Rio Doce destruindo boa parte da vida que encontrava pela frente, no fim de novembro, um dos temores era de que ela atingiria as tartarugas marinhas que ali estavam em pleno processo de desova.
A expectativa era de que as fêmeas pudessem mudar seu comportamento ao ver a lama ou, pior, que pudessem encalhar e até mesmo morrer. Análise feita pela Fundação Pró-Tamar, com apoio da Fundação Boticário, concluiu que nada disso ocorreu. Mas o que por um lado pode ser uma boa notícia, por outro pode também ter colocado as espécies em um novo risco, afinal as futuras mamães continuaram seu caminho tradicional, seguindo em direção ao local por onde a lama se espalhava.
Análise dos efeitos da lama de Mariana nas tartarugas
1 / 4Análise dos efeitos da lama de Mariana nas tartarugas
Análise dos efeitos da lama de Mariana na desova das tartarugas
Jordana Freire, bióloga executora do monitoramento na Praia de Comboios, verifica o sucesso de eclosão dos ovos e quantos indivíduos morreram antes de... Foto: Fundação Grupo Boticário/Projeto Tamar/DivulgaçãoMais
Análise dos efeitos da lama de Mariana na desova das tartarugas
Jordana Freire, bióloga executora do monitoramento na Praia de Comboios, com exemplar de tartaruga cabeçuda Foto: Fundação Grupo Boticário/Projeto Tamar/Divulgação
Análise dos efeitos da lama de Mariana na desova das tartarugas
Técnicos da Tamar fazem a transferência de ovos para um lugar mais seguro antes de a lama chegar à foz do Rio Doce, ao fundo Foto: Fundação Grupo Boticário/Projeto Tamar/Divulgação
Análise dos efeitos da lama de Mariana na desova das tartarugas
Turistas e voluntários acompanham a soltura de filhotes Foto: Fundação Grupo Boticário/Projeto Tamar/Divulgação
PUBLICIDADE
Os primeiros filhotes começaram a nascer em janeiro, e a eclosão dos ovos está em seu auge. Foi solicitado à Samarco a coleta de sangue das fêmeas, de ovos e de animais natimortos, o que está acontecendo desde o fim do ano passado e ainda continua, para análise de contaminantes.
Os ninhos das tartarugas marinhas são feitos ao longo de 39 quilômetros de praias ao norte e 37 ao sul da foz do Rio Doce. A área afetada faz parte da Reserva Biológica de Comboios, uma unidade de conservação costeira que protege um dos únicos dois pontos regulares de desova de tartaruga-de-couro, também chamada de gigante (Dermochelys coriacea) na costa brasileira - uma espécie criticamente ameaçada de extinção -, além de muitos ninhos de tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta), também ameaçada de extinção.
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
1 / 10Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
O serralheiro Gilson Felipe de Rezende, de 42 anos, cuida de cerca de 15 cabeças de gado em um pequeno pasto na margem do Rio do Carmo, na cidade mine... Foto: MÁRCIO FERNANDES/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
Guiando um barco com motor de popa, o pescador Eli da Silva Soares, o Paco, de 38 anos, percorre com cautela parte da região afetada e tem olhos aguça... Foto: GABRIELA BILÓ/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
De cima, a água laranja do Rio Doce parece estática. A lama de rejeitos vinda de Mariana se move a cerca de 1,2 quilômetro por hora desde a quinta-fei... Foto: GABRIELA BILÓ/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
De perto, é mal cheirosa e, mesmo distante mais de 230 quilômetros do ponto do rompimento das barragens, carrega pedaços de árvore e detritos arrancad... Foto: GABRIELA BILÓ/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
No passeio pelo cenário sem vida, não é preciso perguntar nada para ouvir de Paco e de suas irmãs Elaine, de 36, e Eliane da Silva, de 39 anos, os rel... Foto: GABRIELA BILÓ/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
"Isso não vai recuperar nem daqui a cinco anos. Quem falar isso está mentindo", diz o pescado endossado pelas irmãs. "A gente vive disso daqui e agora... Foto: GABRIELA BILÓ/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
Está a exatos 71 quilômetros de distância do ponto em que as barragens da mineradora Samarco romperam. E está encoberto de barro. Foto: MÁRCIO FERNANDES/ESTADÃO
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
Mesmo a essa distância, a lama foi capaz de formar, ali, uma "casca" nas margens e no fundo do rio, que chega a 1 metro de espessura tanto no lado do ... Foto: MÁRCIO FERNANDES/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
O curso d'água em que, antes, era possível navegar de canoa, virou um rio raso. Dá para caminhar de uma margem à outra com água na altura dos joelhos,... Foto: MÁRCIO FERNANDES/ESTADÃOMais
Lama de barragem polui cursos d'água e ameaça subsistência
Nesta crosta de lama ao redor do rio, os peixes aparecem aos montes, grudados no chão de lama, como se fossem fósseis encontrados por arqueólogos. Foto: MÁRCIO FERNANDES/ESTADÃO
O monitoramento do depósito de ovos e depois do nascimento dos filhotes, que já vinha sendo feito há mais de 30 anos pela fundação, ganhou um novo grau de importância depois do acidente com a barreira da mineradora em Mariana. "Será que as fêmeas foram direto para o perigo? É o que estamos avaliando", explica a pesquisadora Ana Cláudia Jorge Marcondes, pesquisadora da Pró-Tamar e responsável pelo projeto.
Logo que se soube que a lama iria chegar ao local, equipes da fundação e voluntários correram para transferir os ovos para locais mais seguros, mais distantes da foz. Desse modo, segundo Ana Cláudia, a lama não chegou a passar por cima deles. Mas o risco é de que as fêmeas, antes de depositar os ovos, tenham se contaminado comendo peixes ou outros animais que tenham sido afetados pela lama, e isso poderia acabar prejudicando os ovos e, por consequência, os filhotes. São as análises químicas que vão mostrar se isso ocorreu. Os resultados devem sair em dois meses.
Também vai ser considerado o sucesso de nascimento dos animais. Em média, diz Ana Cláudia, de 70% a 80% dos ovos eclodem com sucesso. A quantidade deste ano, comparada com a média histórica, vai ser importante para ver se o acidente ambiental prejudicou as tartarugas marinhas.
Publicidade
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
1 / 14Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
Lama
A lama de rejeitos de minério que vazou da barragem da Samarco já chegou ao mar, após passar pelo trecho do Rio Doce no distrito de Regência, em Linha... Foto: Gabriela Biló/EstadãoMais
Lama
A onda de lama percorreu mais de 650 quilômetros em 16 dias Foto: Gabriela Biló/Estadão
Lama
Nos últimos três dias a onda de lama passou por Colatina e Linhares, causando mortandade de peixes e comprometendo o abastecimento de água Foto: Gabriela Biló/Estadão
Lama
A previsão do Ministério do Meio Ambiente, com base em projeções feitas por pesquisadores da Coppe-UFRJ, é que os sedimentos se dispersarão por uma ár... Foto: Gabriela Biló/EstadãoMais
Lama
É uma região de reprodução de tartarugas marinhas, inclusive de uma espécie criticamente ameaçada de extinção, a tartaruga-de-couro. Vários ninhos for... Foto: Gabriela Biló/EstadãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
Antes da lama mais pesada, alinha de frente da mancha, composta de um material mais leve e fino, tocou as ondas do litoral de Regência, um distrito do... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
O rio Doce deságua no mar em Linhares, cidade que fica no norte do Espírito Santo. Foi montada uma barreira para tentar conter os rejeitos de minério,... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
Os governos de Minas e do Espírito Santo se articulam para entrar com ação conjunta na Justiça contra a mineradora Samarco, controlada pela Vale e pel... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
O desastre ambiental em Mariana, considerado o maior já ocorrido no Brasil, deixou, até agora, oito mortos. Quatro corpos ainda não foram identificado... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
A lama que vazou com a queda das barragens, depois de destruir Bento Rodrigues (MG), atingiu o Rio Doce via afluentes, chegando ao Espírito Santo. Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/Divulgação
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
A onda de lama tem levado destruição à biodiversidade do Rio Doce, desde o município homônimo em Minas, onde nasce. Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/Divulgação
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
Boias infláveis estão sendo usadas pela mineradora Samarco para tentar conter os danos na foz do Rio Doce, em Linhares, no litoral do Espírito Santo Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/Divulgação
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
A dispersão da lama pode ser de 3 km em direção ao norte e de 6 km em direção ao sul quando elas atingirem o mar pela foz do Rio Doce, informou a mini... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
O desastre foi a maior catástrofe ambiental do País Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/Divulgação