PARIS - A 18 dias da abertura da 21º Conferência do Clima (COP 21) das Nações Unidas, o secretário de Estado americano, John Kerry, descartou nesta quinta-feira, 12, que o evento vá resultar em um acordo obrigatório, na forma de um tratado para limitar o aumento médio da temperatura na Terra. A declaração é uma ducha de água fria nas expectativas de sucesso da conferência, porque o que se esperava até aqui era um acordo internacional, à imagem do Protocolo de Kyoto, que obrigasse governos a reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
A declaração de Kerry foi feita em entrevista ao jornal Financial Times. O secretário de Estado afirmou que a COP 21 deve decidir pelo investimento de "montantes significativos" na luta contra o aquecimento global, mas descartou que haja um caráter obrigatório no documento.
"Definitivamente não será um tratado", disse Kerry, reforçando a seguir que "não será um acordo legalmente obrigatório de metas redução de emissões como Kyoto". O Protocolo de Kyoto foi firmado na 3ª Conferência do Clima (COP 3), realizada no Japão em 1997.
Dezoito anos depois, é um acordo com a mesma força legal que a comunidade internacional negociará na COP 21, que será realizada e Paris a partir de 30 de outubro. Por isso as declarações de Kerry geraram estranheza e críticas na França, país-sede do evento, cujo governo terá a missão de intermediar as negociações diplomáticas. Ainda pela manhã, o chanceler francês, Laurent Fabius, lamentou a declaração do americano. "Eu creio que é uma formulação que poderia ser mais feliz", disse o ministro em tom diplomático. "O fato de que um certo número de disposições deverá ter efeito prático e ser legalmente vinculante é óbvio. Logo, não vamos confundir as coisas, o que talvez Kerry tenha feito."
Mais tarde coube ao presidente da França, François Hollande, demonstrar as divergências entre a expectativa dos Estados Unidos e a da União Europeia. "Se um acordo não for legalmente vinculante, não haverá um acordo, porque isso significaria que seria impossível verificar e controlar os compromissos que serão assumidos", justificou o chefe de Estado francês, advertindo para as dificuldades nas negociações. "Eu sei o quanto é difícil, mas nós devemos dar ao acordo de Paris, se jamais houver um acordo, um caráter obrigatório no sentido de que os engajamentos que serão assumidos devam ser respeitados."
À noite, a Casa Branca não quis comentar a polêmica entre os dois governos.
Nas últimas semanas, uma atmosfera de otimismo pairava sobre as reuniões preparatórias da COP 21, a tal ponto que chefes de Estado e de governo de 117 países - inclusive Barack Obama, presidente dos Estados Unidos - confirmaram presença em Paris para a abertura do evento.
Na segunda-feira, Christiana Figueres, secretária-executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (UNFCCC), reiterou ao Estado que "haverá um acordo" em Paris - mas ainda resta saber a sua amplitude. Dados da ONU indicam que as metas nacionais de cortes voluntários nas emissões de gases de efeito estufa seriam suficientes apenas para conter o aquecimento médio da temperatura na Terra a 2,7ºC até 2100. Esse patamar fica além do limite de 2ºC, considerado mais seguro pela comunidade científica.