PUBLICIDADE

'A gente aprende com fracassos', diz presidente do BID

Em entrevista à BBC Brasil, Luis Alberto Moreno admite que houve falhas em projetos financiados pela instituição, mas diz que 'nenhum projeto é perfeito'.

Por Júlia Dias Carneiro
Atualização:

Prestes a completar sete anos como presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), após ter sido reeleito para um segundo mandato em 2010, o diplomata e empresário colombiano Luis Alberto Moreno admitiu, em entrevista à BBC Brasil, que houve falhas em projetos financiados pela instituição, mas afirmou que o banco "revisa e aprende" com os fracassos. "Nenhum projeto é perfeito", disse Moreno. A declaração vem na esteira da aprovação de uma linha de crédito de US$ 452 milhões (R$ 904 milhões) para um novo projeto do governo do Rio cujo objetivo é reduzir a poluição da Baía de Guanabara, um dos muitos cartões-postais da cidade prejudicados pela extrema poluição. Na década de 90, o banco já havia concedido US$ 1 bilhão, em valores da época, para outra projeto com a mesma finalidade que, entretanto, não foi bem sucedido. No Rio de Janeiro para a Rio+20, a conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Moreno concedeu a seguinte entrevista à BBC Brasil. BBC Brasil - O BID está anunciando uma ampliação dos recursos voltados para projetos sustentáveis. Qual parcela dos empréstimos do banco será destinada à sustentabilidade? Luis Alberto Moreno - De toda o volume de crédito que temos, vamos destinar 25% para projetos ligados a meio ambiente, mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável. Isso equivale a aproximadamente US$ 3,1 bilhões (US$ 6,2 bilhões) por ano. Ou seja, nos próximos três anos, estamos falando de cerca de US$ 10 bilhões (R$ 20 bilhões) somente do BID para os países da América Latina e Caribe. BBC Brasil - Como o banco age para garantir que o empréstimo tenha o destino correto? Quais são os mecanismos para proteger esses recursos? Moreno - São vários os mecanismos. Todos os projetos que financiamos têm de estar acima de um patamar mínimo de impacto no meio ambiente. Também realizamos uma avaliação permanente ao longo de cada projeto. Se encontramos problemas, há casos em que não liberamos os recursos, e os projetos acabam atrasando até que sejam corrigidos. Em algumas ocasiões, interrompemos os projetos porque verificamos que a outra parte não tem capacidade ou o governo já não quer continuar fazendo o investimento. Também monitoramos os mecanismos de transparência, muito importantes para as aquisições públicas. BBC Brasil - Mas o BID investiu US$ 1 bilhão (R$ 2 bilhões) na despoluição da Baía de Guanabara nos anos 1990 e o programa acabou sendo um fracasso. O que deu errado? Como evitar que novos empréstimos acabem fracassando? Moreno - A despoluição da Baía de Guanabara é um processo contínuo, e sua solução completa transcende o que o BID ou um ator sozinho possa realizar. O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), que teve início há alguns anos e contou com várias fontes de financiamento, contemplava fases que ainda estão em processo de implementação. Sem o PDBG, uma quantidade adicional de dois metros cúbicos de esgoto por segundo estaria sendo despejada sem tratamento ali. O banco continua apoiando o estado do Rio de Janeiro em alcançar suas metas ambientais, entre as quais, elevar o volume de esgoto tratado dos atuais 30% para 60%. Para tanto, concedemos em março (passado) o empréstimo de US$ 452 milhões para o Programa de Saneamento Ambiental dos Municípios do entorno da Baía de Guanabara (PSAM). O diferencial deste programa em relação ao que foi feito até agora é que ele aumenta o raio de abrangência para os municípios do entorno da Baía de Guanabara. O objetivo é aumentar a coleta e tratamento das águas nas localidades vizinhas da baía, onde moram mais de 10 milhões pessoas. BBC Brasil - Mas como é possível garantir que os recursos sejam devidamente aplicados e que o problema não ocorra novamente desta vez? Moreno - Nenhum projeto é perfeito. O mais comum é que haja falhas institucionais, de concepção ou de implementação. Quanto nos deparamos com uma situação dessas, estudamos o que aconteceu (de errado) e por que as coisas não foram bem feitas. Nós revisamos e aprendemos (com nossos erros). O que muda para o BID com a Rio+20? As discussões sobre sustentabilidade alteram, de alguma forma, a atual política de concessão de empréstimos do banco? Nada (muda). Mas aqui temos a oportunidade de apresentar nossos projetos e conversar com pessoas sobre a situação especial da América Latina. Há 20 anos, os europeus falavam para o mundo sobre energias renováveis. Hoje, a América Latina tem muito a dizer. Basta olhar para o exemplo da Costa Rica ou do Brasil. Os empréstimos continuam sendo feitos da mesma forma. Não acho que essa conferência mude nossa forma de operar. Há um processo contínuo de aprimorar a qualidade dos empréstimos que concedemos. BBC Brasil - Na sua opinião, qual será o resultado prático de todas as conversas e negociações realizadas durante a Rio+20 que, por enquanto, estão travadas? Moreno - Há muita energia positiva para estabelecer parcerias. Aqui temos a oportunidade de encontrar governos, agências de desenvolvimento, o setor privado e falarmos sobre como podemos nos conectar e alavancar bons projetos. Tudo isso é apenas o começo de muita coisa que vai acontecer no futuro. Estamos acostumados a sempre cobrar números, fazendo perguntas do tipo: "mostre-me o dinheiro, diga o quanto foi feito aqui". Mas isso é um processo. Há 20 anos, quando ocorreu a Eco-92, as pessoas também diziam que houve pouca ambição e que nada aconteceu. Hoje, as pessoas veem a Eco-92 como um encontro de sucesso. As pessoas aqui gostariam de ter chegado a resultados mais ambiciosos, mas vivemos em um mundo onde os países mais ricos estão com dificuldades econômicas tremendas. Os países emergentes têm muitas aspirações. Mas muitos ainda não encontram respostas sobre como chegar a um crescimento verde inclusivo. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.